Um projeto de lei (PL) em tramitação na Câmara de Cuiabá propõe limitar a atuação dos chamados ‘flanelinhas’ nas ruas da Capital.
O projeto foi apresentado pelo vereador Tenente Coronel Dias (Cidadania). Inicialmente, Dias queria proibir a atividade, mas após questionamentos de colegas e de observar uma lei federal, mudou o texto e agora quer somente limitar a atuação para quem for cadastrado na Prefeitura.
Ele retirou o projeto inicial que previa a proibição da atividade na última terça-feira (5), mas reapresentou o texto com alterações na quinta (7).
De acordo com o projeto, a lei visaria garantir maior segurança à população, organizar o uso do espaço público e coibir práticas abusivas frequentemente relatadas pelos cuiabanos.
O texto também argumenta que hoje os motoristas são abordados de forma insistente em diversas áreas da cidade pelos guardadores de veículos, exigindo a contribuição financeira sem que haja qualquer contrato formal e em situações mais graves há registros de intimidação e ameaças quando o motorista se recusa a pagar.
O vereador alega que a medida acabaria com a exploração informal e descontrolada de vagas públicas e com a sensação de insegurança dos motoristas abordados pelos guardadores (leia o projeto de lei AQUI).
Constitucionalidade
O decreto presidencial 79.797 do ano de 1977 regulamenta o exercício da profissão de guardador de veículos.
O professor de Direito da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), André Araújo Molina, acredita que isso torna uma proibição inconstitucional e que na verdade a lei já delimita a atuação dessa atividade.
Acervo Pessoal
O pós doutor em Direito e professor da UFMT, André Araújo Molina
“O decreto do presidente em 1977 regulamentou a atividade, então ela não é proibida, não é ilícita. O raciocínio que pode ser feito é: pode uma lei municipal proibir qualquer outra profissão? Isso, claramente, seria inconstitucional”, disse o advogado.
Molina citou que em Porto Alegre foi aprovada uma lei parecida e a questão agora foi levada ao Supremo Tribunal Federal, que decidirá a constitucionalidade dela. Ele acredita que o Supremo vai reconhecer que os municípios não podem impedir a atividade.
“Por que a profissão de flanelinha poderia ser limitada? Por isso que suponho que o Supremo vai decidir que esta lei gaúcha é inconstitucional e este raciocínio vai valer para o Brasil todo, inclusive para Cuiabá", disse.
De acordo com Dias, o novo projeto quer que essa legislação seja cumprida em Cuiabá e que haja uma fiscalização por parte da Prefeitura e da Polícia Militar.
“É o mesmo projeto, mas só autorizando a realizar essa atividade quem cumprir os objetivos estabelecidos na lei de 50 anos atrás. É um cadastramento, e quem não for cadastrado ficará proibido [de exercer]. A fundamentação dessa lei é proibir somente aquelas pessoas que não cumprem a lei”, disse o vereador Dias.
Cadastramento
De acordo com a lei de 1977 (Leia a lei AQUI), somente seria permitido a atuação aos profissionais que fossem registrados no Ministério do Trabalho e que apresentem documentos como atestado de bons antecedentes, certidão negativa dos cartórios criminais e prova de quitação com o serviço militar.
Na prática, todos as pessoas que hoje atuam como ‘flanelinhas’ atuam na informalidade.
“O cadastramento então seria como um filtro e, só de colocar esse filtro, nós vamos ter uma quantidade de pessoas habilitadas muito pequena. O que vemos hoje são pessoas que vivem nas ruas usando drogas e quando ele quer o dinheiro ele vai 'cuidar de carro'. Cabe a Prefeitura fiscalizar”, explicou o parlamentar.
“Com a aprovação desta lei, as pessoas estarão de forma legal. A partir de que procure a Prefeitura e se cadastre, aí vai poder realizar essa atividade e nós, enquanto população, poderemos cobrar se o carro for furtado, danificado ou se houve algum tipo de assédio moral ou sexual”, completou.
Insegurança
Uma das justificativas apresentadas pelo vereador é a insegurança do motorista, que se sente coagido a pagar e teme por represálias, como danos ao seu veículo, caso se recuse a pagar o valor.
“O meu objetivo é que nós precisamos ampliar a sensação de segurança e essa atividade, a maioria das pessoas pagam por receio, por medo. Todas as pessoas que cuidam dos carros hoje em Cuiabá estão agindo de forma ilegal e nós temos alguns perfis dessas pessoas: são na maioria moradores de rua e usuários de drogas e pegam esse dinheiro para comprar entorpecente”, conta Dias.
Para o professor Molina, hoje isso já é um crime e não precisa de um outro projeto de lei municipal para regulamentar, até porque isso não é competência municipal. Segundo ele, qualquer um que se sinta coagido ou for ameaçado pode ligar na hora para a Polícia e denunciar.
“O que nunca pôde, independentemente desse projeto de lei, é eventualmente haver constrangimento ou danos ao veículo de quem não aceita. Mas para isso nós já temos a lei penal”, disse o professor.
“Então se algum flanelinha constranger alguém que não queira pagar, ameaçar ou gerar algum dano, o código penal já atua, a pessoa liga para a polícia e o flanelinha é detido se ele extrapolar e cometer alguma coação ou dano. Agora, se ele estiver na rua ‘oferecendo’, atividade e de forma espontânea a pessoa aceitar, isto não se configura crime no Brasil”.
O projeto deve continuar em debate no Legislativo municipal e pode ser votado já na próxima semana.
A reportagem também entrou em contato com a secretária Municipal de Ordem Pública, Juliana Palhares, para saber o posicionamento da Pasta sobre o projeto e sobre o cumprimento da lei de 1975 na Capital, mas não obteve retorno.
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