A nova gestão da Unimed Cuiabá, sob a presidência do urologista Carlos Bouret, conseguiu colocar a cooperativa de volta nos trilhos, após a descoberta de um rombo de R$ 400 milhões deixado pela gestão passada.
Segundo Bouret, esse foi o período mais desafiador dos 48 anos de história da Unimed, mas com trabalho a equipe está levando a cooperativa "ao seu ponto de equilíbrio”.
“A unidade responde hoje entre 60% e 70% do faturamento bruto dos hospitais da Capital. Se não puxássemos o freio e virássemos a cara do navio para o rumo certo, nós teríamos quebrado a saúde de Cuiabá”, afirma.
Em menos de um ano, diz Bouret, a gestão teve um saldo positivo diante da situação, “aumentando a receita” e “enxugando os gastos”.
“Em 2024 vamos começar a colher os frutos do esforço que fizemos para frear a situação. Acho que vamos ter muita coisa boa para oferecer”, afirmou.
Em entrevista ao MidiaNews, ele também falou dos novos centos de terapia inaugurados neste ano, além dos projetos para 2024.
Confira os principais trechos da entrevista:
MidiaNews - O que o senhor pode nos falar a respeito deste primeiro ano à frente da Unimed?
Carlos Bouret - Fizemos um trabalho muito forte no enxugamento dos custos administrativos. Foram 250 demissões, sacrificando talentos dentro da cooperativa. Revisamos todos os contratos de prestação de serviço, desde vigilância, limpeza, terceirizações, os contratos de coordenação. Fizemos um enxugamento do número de cargos para otimizar o gestor.
Fizemos alongamento de prazos de empréstimos. Houve uma revisão dos contratos administrativos, fizemos o destrato de aluguéis de imóveis que não estavam sendo utilizados pela Unimed. Fizemos uma revisão da tabela dos hospitais, tabela dos laboratórios, da radiologia. Ainda estamos trabalhando nisso. Encontramos uma obra de hospital inaugurado que estava inacabado, onde conseguimos ampliar o pronto atendimento, oferecemos mais conforto e melhor atendimento para os nossos usuários.
Próximo ao Sesc Arsenal inauguramos o nosso Centro de Terapias Especiais com dois pavilhões, um de fisioterapia e o outro para atender as terapias especiais do espectro autista. Ainda continuaremos com uma rede credenciada. O espaço é fantástico, muito bem montado. Estamos há oito meses trabalhando, terminando a obra, montando equipe, móveis planejados para receber o paciente. Contratamos a consultoria do Ricardo Martone, que tem mestrado e doutorado em TEA (Transtorno do Espectro Autista).
Contratamos terapeuta ocupacional, neuropediatra, psicólogas entre outros profissionais especializados em várias áreas de tratamento do transtorno. Ela nasce pequena para a nossa necessidade, mas vamos continuar crescendo e trabalhando para oferecer o melhor serviço de Cuiabá. Com ela iremos usar nossos próprios recursos, reduzindo o custo de tratativas com a rede aberta. São mais de 40 profissionais somente no Centro de Terapias Especiais.
MidiaNews - E para 2024, o que a Unimed está projetando?
Carlos Bouret - Em janeiro iniciaremos as atividades da nossa UTI própria com 10 leitos e outros 10 de enfermaria, e mais duas salas de cirurgia para dar apoio. Já temos uma UTI dentro do hospital Santa Helena, mas com uma ocupação pequena. E segue o plano de recuperação que começou em 2023, com as medidas de austeridade. Em 2024 vamos começar a colher os frutos do esforço que fizemos para frear a situação da Unimed. Acho que nós vamos ter muita coisa boa para oferecer.
MidiaNews - Uma auditoria contratada neste ano constatou um prejuízo contábil de R$ 400 milhões na Unimed, gerando tumulto na transição entre as gestões. Que desafios encontrou nesse processo?
Carlos Bouret - Ao longo de 2022 construímos um movimento de oposição à gestão pelo que víamos na forma como a cooperativa estava sendo gerida e queríamos uma mudança radical. Dentro do conceito fiscal observamos inúmeras irregularidades e vícios de gestão que levaram a cooperativa a ter prejuízo. Assumimos no dia 4 de março com o balanço reprovado pela assembleia ordinária, por inconsistências graves. Entramos no dia 6 sem o período de transição, em virtude da animosidade criada dentro da assembleia. Foi um desafio gigantesco começar com uma empresa do tamanho da Unimed sem um balanço aprovado para que pudéssemos fazer o cadastro da cooperativa nos bancos e que as operações fossem normais. Isso foi só o começo.
Depois o balanço foi retificado. Ele tinha sido proposto à assembleia com resultado positivo de R$ 300 mil e, na verdade, o balanço auditado mostrou um prejuízo de R$ 400 milhões. Foi um período bastante turbulento de muita ansiedade. Foi o mais desafiador dos 48 anos da nossa Unimed, disso eu tenho certeza.
MidiaNews - Como a gestão lidou com uma dívida dessas?
Carlos Bouret - Quando você tem prejuízo em cooperativismo, ele tem que ser distribuído entre os cooperados. Em tese teríamos que fazer um rateio desses R$ 400 milhões por menos de 1,4 mil cooperados, no nosso estatuto a sobra ou perda tem que ser rateada proporcionalmente às operações do cooperado durante aquele exercício, o exercício em 2022. Haveria cooperados com uma participação muito maior na reposição dessas perdas, dependendo do tanto que ele recebeu de pró-labore durante o ano.
Era impossível fazermos o cooperado repor os R$ 400 milhões, tínhamos consciência disso. Então levamos para a assembleia o balanço retificado dentro das normas de contabilidade regular e da ANS (Agencia Nacional de Saúde Suplementar) e aprovamos uma recomposição de R$ 150 milhões. Os R$ 250 milhões restantes do balanço estão em standby para que a cooperativa, em melhorando o seu resultado e obtendo sobras novamente, possa cobrir o prejuízo, que não deixa de existir contabilmente na conta de cada cooperado.
A Unimed Cuiabá responde hoje entre 60% e 70% do faturamento bruto dos hospitais, laboratórios e clínicas radiológicas da Capital. Se não puxássemos o freio e virássemos a cara do navio para o rumo certo, nós teríamos quebrado a saúde de Cuiabá.
MidiaNews? Um PAD (Processo Administrativo Disciplinar) foi aberto contra o ex-presidente Rubens Carlos. Qual foi o resultado deste PAD? Do ponto de vista cível, a Unimed pretende responsabilizar a gestão passada por este rombo?
Carlos Bouret - O processo disciplinar foi aberto contra todos os diretores executivos e os conselheiros da gestão anterior. Esse processo está ainda correndo no Conselho Disciplinar Cooperativista. Já encaminhamos atas notariais de mensagens de celular com orientação para fazer este ou aquele movimento dentro da contabilidade, de forma a ter um resultado positivo no balanço. Soubemos de coisas que estavam sendo ocultas dos cooperados, as notificações da ANS exigindo que a Unimed fizesse várias provisões e recomposições do patrimônio líquido sob o risco até de uma intervenção.
Encaminhamos para o Conselho Disciplinar Cooperativista as atitudes dos ex-diretores de construir um balanço que tinha o objetivo de ocultar a real situação da cooperativa. Esse processo é lento, eles têm amplo direito de defesa e alegaram não concordar com o resultado, pediram uma perícia do balanço. Só que no nosso entendimento e do Conselho Disciplinar Cooperativista, o processo não se trata do resultado do balanço e, sim, das atitudes que tomaram para fazer com que ele parecesse ter um resultado diferente do real.
A Unimed apresentou, junto ao Ministério Público Federal, uma notícia-crime por causa da gestão que preparou um balanço que não correspondia à realidade e enviou para uma autarquia federal como sendo verdadeira. Dentro da esfera civil também entramos com um processo contra os outros ex-gestores. A Unimed tinha uma receita menor que suas despesas.
MidiaNews - Como estão as finanças da Unimed Cuiabá neste momento?
Carlos Bouret - Estamos trazendo a Unimed ao seu ponto de equilíbrio. Nós, cooperados, somos os donos da empresa e injetamos R$ 150 milhões, uma Mega-Sena acumulada, em dois meses. Isso mostra que o cooperado acredita, principalmente, na cooperativa. E acreditamos que acredita em nós também, o que nos dá mais força para trabalhar. Não corrige todos os problemas acumulados nesses sete anos da última gestão, mas estamos trabalhando para um novo tempo de mudança.
Com todo o trabalho que fizemos este ano, ainda não conseguimos virar a sinistralidade da Unimed, mas conseguimos reduzi-la. Essa virada da carteira não é do dia para a noite. Estamos fechando o ano ainda com prejuízo, mas muito menor do que herdamos das gestões passadas. Avançamos muito, ainda temos muito a evoluir para diminuir essa sinistralidade, parametrizar procedimentos, parametrizar condutas, renegociações, a redução com as liminares e tratativas para terapias especiais, fisioterapia neurológica e terapia do espectro autista. Mas o balanço apresentado em assembleia já prova que enxugamos os gastos e aumentamos a receita. Dentro dessa conta, o saldo é positivo.
MidiaNews - Usuários reclamam da dificuldade de se encontrar certos especialistas que atendam pela Unimed, como endocrinologistas e psiquiatras, por exemplo. Por que isso ocorre?
Carlos Bouret - Há poucos profissionais para a necessidade da população em geral e isso é um problema no Brasil inteiro. É tudo questão de oferta e demanda. Se eu acho que o que eu atendo de paciente no privado compensa mais do que atender pela Unimed, o colega acaba saindo. Há muitos anos foram implantados planos para a pediatria, um adicional na consulta para que aquele pediatra acompanhe o paciente com várias consultas sucessivas e não fique desestimulado. Uma vez que se eu atendo hoje, durante 3 ou 4 semanas, e o paciente voltar todo dia no meu consultório, eu não ganho nada, porque é considerado de retorno. Só que isso não é uma exclusividade de Cuiabá. Em todo lugar tem os mesmos problemas com os mesmos especialistas.
Estamos procurando suprir essas necessidades, fizemos um estudo com quatro empresas de telemedicina para atender a demanda reprimida de especialidades que não dependem somente de um exame físico. Conseguimos uma empresa de nome forte no mercado e já estamos com pacientes em acompanhamento nesse ambulatório virtual. Temos trabalhado para reter talentos entre os cooperados, mas não podemos desequilibrar o honorário de uma especialidade e deixar que ele fique descolado das outras. Todos somos cooperados, todos somos donos da cooperativa.
MidiaNews - Neste ano a Unimed Cuiabá denunciou um esquema de falsificação de documentos para se obter decisões para tratamento em clínicas não conveniadas. Existem muitas fraudes contra a cooperativa? De que forma combate-las?
Carlos Bouret - Dentro do mercado de saúde suplementar existe a fraude muito comum de reembolso de consultas. Na Unimed o pedido de consulta e do exame é eletrônico, tem biometria, não é mais assinar um recibo. Dentro das consultas não temos detectado fraudes como em outros planos de saúde com sistemas mais vulneráveis.
Encontramos um problema com as terapias especiais, que não tinham uma auditoria. Aglutinamos as informações para saber quanto pagávamos por serviço e vimos que havia tabelas díspares. O mesmo prestador atendia paciente na Unimed por três valores diferentes a hora, dependendo da tratativa feita. Passando o peito-fino detectamos um “vício” de um mesmo médico não cooperado, uma mesma advogada e uma mesma clínica que levavam o Judiciário ao erro.
Havia um conluio desse triunvirato que utilizava de má-fé com as famílias dos autistas. Pegavam o mesmo laudo e a mesma negativa falsa, de muitos anos atrás, e a advogada plotava o nome da criança, alterava a data e entregava para o Judiciário. Só esses 10 casos que encontramos iriam gerar um prejuízo de mais de R$ 3 milhões por ano.
MidiaNews - E as liminares obrigando a cooperativa a pagar tratamentos não previstos na Agência Nacional de Saúde Suplementar? Qual o impacto destas liminares na contabilidade da cooperativa?
Carlos Bouret - Aí se confunde um pouco as liminares que são emitidas para neurofisioterapia, neurofisiológica e as várias terapias do espectro autista. A Unimed vai consumir cerca de R$ 110 milhões por ano do seu faturamento só com essas terapias especiais, não só com as liminares. A nossa preocupação é acolher o paciente e dar o melhor tratamento, com um custo que não ofenda a mutualidade. Não posso supervalorizar o tratamento de uma parcela de 2,5 mil usuários, eu estaria usando 10% do meu faturamento para tratar 1% dos pacientes. Não são todos que estão com liminares, já estamos acolhendo pacientes na clínica nova, acolhendo a família. Isso vai gerar uma economia para a cooperativa com um atendimento primoroso.
Tivemos outras liminares ao longo dos anos, por exemplo, com as cirurgias plásticas reparadoras de pós-bariátrica. Chovia liminar, porque tinham procedimentos que não estavam no rol da ANS. Liberava uma abdominoplastia, mas não autorizava a correção do braço, por exemplo. Aí entrava a liminar para mandar você pagar o preço que estava naquele orçamento para fazer tudo. Temos excelentes cirurgiões plásticos cooperados que foram chamados e o que não estava no rol da ANS, nós discutimos em uma nova tabela. Então não tem mais liminar com cirurgia plástica e abaixamos o nosso custo desenfreado.
Estamos cuidando da cooperativa com olhos no custo, com olhos no desperdício e com olhos no nosso consumidor, o maior cliente da Unimed.
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2 Comentário(s).
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Jorge 01.01.24 12h42 | ||||
Se o Brasil fosse um país sério os responsáveis estariam na cadeia. | ||||
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Graci Miranda 01.01.24 10h44 | ||||
Sem comentários! | ||||
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