Havia um tempo em que o nome de Anderson Torres circulava nos corredores da Polícia Federal como o de alguém que subia com passos firmes. Delegado respeitado, estudioso, pai de família — desses que parecem ter encontrado algum equilíbrio entre o peso do distintivo e o das responsabilidades domésticas. A carreira ia reta, brilhante até, como uma estrada bem asfaltada sob sol de meio-dia.
Mas o problema das estradas muito retas é que, às vezes, a gente passa a acreditar que o destino é sempre previsível. E foi então que veio a política, com seus atalhos sombrios, suas curvas disfarçadas, e — como em toda boa tragédia — o canto sedutor que promete influência, poder, proximidade com o centro da cena.
Dizem que marinheiros experientes também podem cair no canto da sereia. Que a vaidade, essa ruína silenciosa, não poupa nem os que aprenderam a desconfiar de tudo. E talvez tenha sido isso: um delegado acostumado a farejar ciladas, mas que, por algum motivo insondável, não percebeu a armadilha que existe em confiar demais em políticos, em governos, em salvadores improváveis.
O fato é que a história deu sua guinada brusca. De gabinete em gabinete, a carruagem virou abóbora. E o homem que já ocupou ministérios, que já comandou instituições, que já viu portas se abrirem à sua passagem, se viu reduzido ao silêncio de uma cela — metáfora ou realidade, pouco importa aqui: importa o isolamento, aquele tipo de solidão que só visita quem um dia esteve cercado de gente demais.
A crônica da vida é cruel: o elogio desaparece, a lealdade evapora, e os que bateram nas costas se afastam rápido, como se o contato pudesse contaminar. É assim com quase todos os que se deixam servir a interesses alheios sem medir o preço. A história é impiedosa: esquece com facilidade os que caminharam por conta de outros, e não por si.
Se Anderson Torres será lembrado ou esquecido, só o tempo decide. Mas algo o caso ensina: até carreiras brilhantes podem tombar quando confundem poder com pertencimento, quando trocam prudência por sedução, quando delegados passam a acreditar que sereias cantam para salvá-los — e não para puxá-los, suavemente, para o fundo.
No fim, talvez sua história seja apenas mais uma dessas parábolas modernas sobre confiança mal depositada, sobre ambição mal calibrada, e sobre a solidão inevitável daqueles que, em algum momento, deixaram de ouvir o som da própria consciência para seguir a música de quem jamais estaria lá quando a maré baixasse.
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