KATIANA PEREIRA
DA REDAÇÃO
O cônsul argentino Gabriel Herrera acusou as polícias Civil e Militar de Mato Grosso de despreparo, no episódio do espancamento e prisão de dois professores argentinos, na madrugada de sábado (31), em Cuiabá.
Em entrevista coletiva, nesta quinta-feira (5), Herrera negou que a violência contra cidadãos da Argentina em território brasileiro ocasione um incidente diplomático entre os dois países.
Os irmãos Ignácio Luiz Marcelo Lujan, 29, e Ignácio Augustin Lujan, 26, professores universitários de Córdoba (Argentina), disseram ter sido espancados e presos, arbitrariamente, por policiais militares de Mato Groso, quando saíam da casa noturna Gerônimo, localizada na Rua Cândido Mariano, no Centro da Capital.
Os professores foram agredidos pelos policiais militares Robson Rocha e Franco Nascimento, os dois são lotados em Santo Antônio do Leveger.
Falta de comunicação e agressões
Herrera é chefe da seção Jurídica da Embaixada da República Argentina no Brasil e foi enviado para Cuiabá, a pedido da Embaixada Argentina, para mediar, junto à Secretaria de Segurança Pública, a libertação dos professores.
“Fui chamado para resolver essa situação, mas não foi fácil. A embaixada ligou três vezes para o Presídio Carumbé e não foi atendida. O diretor não estava e muito menos o adjunto. Além do mais, nossos irmãos possuem nível superior e foram encaminhados para cela comum. Antes disso, foram espancados, e um perdeu três dentes e estourou um ouvido. Mesmo se eles tivessem roubado, coisa que não aconteceu, não poderiam ter sido espancados dessa forma. Eles fizeram exame de corpo de delito e foram atendidos pelo médico do presídio. Estavam muito abalados e machucados. Foram muitos socos no rosto”, disse o jurista.
Despreparo policial
O cônsul disse ainda que a situação foi agravada por falta de postura ética e despreparo dos órgãos de Segurança do Estado. Ele explicou que, em qualquer situação que envolva estrangeiros, a primeira coisa a se fazer é comunicar o fato à embaixada do país envolvido.
“Não houve comunicação por parte da Secretaria de Segurança, Polícia Civil ou Militar. Sabendo que se tratava de estrangeiros, ninguém soube o que fazer. Prenderam nossos irmãos e não comunicaram o seu país de origem. Isso fere o tratado entre Brasil e Argentina, que possuem uma ótima relação. Faltou preparo da Polícia, faltou trato. A situação só foi resolvida depois que o Itamaraty entrou no caso: logo depois, fomos recebido pelo secretário-adjunto de Segurança Pública. Ele lamentou muito o fato e intermediou a liberação dos irmãos”, contou Herrera.
Propaganda negativa
O cônsul observou que atitudes como essa podem ser uma péssima propaganda do Brasil, que está nos preparativos para sediar a Copa do Mundo de 2014.
Herrera acredita que eventos como esse sujam a imagem do país e expõem uma completa falta de estrutura para receber turistas.
“A prisão e agressão arbitrária de nossos irmãos revelam um lado muito ruim do Brasil. É uma péssima propaganda. Com certeza, a maior nação que o Brasil vai receber é de argentinos, devido à nossa paixão pelo futebol e à proximidade territorial. É péssimo saber que duas pessoas de bem foram espancadas, não há nada que justifique isso. E não é bom para o Brasil uma postura como essa. É necessário rever o preparo dos policiais e também dos órgãos de segurança pública”, analisou o jurista.
Denúncia falsa
A advogada Beatriz Viana, que acompanhou a prisão dos professores e intermediou a liberação deles, disse que várias falhas ocorreram em todo o processo. Desde a falsa denúncia de furto até a forma como eles foram detidos.
“É vergonhoso para nós brasileiros um papelão desse. Esse rapazes foram presos e espancados por policiais militares, que estavam a paisana, se divertindo, bebendo e dançando. Ficou evidente o ciúmes que sentiram dos irmãos argentinos. Eles tiveram vários direitos privados, inclusive, o de serem representados por um advogado. Só fiquei sabendo da situação por que a minha cunhada que é colombiana, presenciou a confusão e me ligou. Fui até a Central de Flagrantes e os professores, já espancados, me imploraram por ajuda”, lembrou Beatriz.
A advogada também disse que a acusação de furto é descabida. Segundo ela, os professores estavam com muito dinheiro, objetos de valor, acompanhados das notas fiscais.
“É um absurdo dizer que eles roubaram uma câmera fotográfica, que não custa mais de R$ 300. Sendo que eles possuem um máquina no valor de R$ 22 mil, que foi comprada em Madri [capital da Espanha] e eles possuem a nota fiscal. Eles tinham mais de R$ 6.600,00 em dinheiro, possuem cartões de crédito internacional, oito mil euros depositados em uma conta”, informou.
Retorno para a Argentina
Na quarta-feira (4), o cônsul Herrera, acompanhado na advogada Beatriz Viana, disse ter enfrentado uma verdadeira "via crucis’, para garantirem a liberdade dos irmãos.
O cônsul disse que os irmãos iam procurar um dentista para fazer a reposição dos dentes. Ele sustentou que as autoridades Argentinas não pretendem entrar com ação contra o Estado, mas que irão acompanhar o andamento do processo, para assegurar que seja provada a inocência dos dois professores.
“Os irmãos estão muito magoados com a humilhação que passaram. Estava no planejamento deles conhecerem a Amazônia, mas irão retornar para nosso país e tentar esquecer esse trauma. A única vontade que eles têm é de provar que são inocentes e apagar esse triste episódio de suas histórias”.
Luiz e Ignácio foram colocados em liberdade na madrugada desta quinta-feira. Eles seguiram para Brasília e, de lá, irão retornar à Argentina.