O ex-secretário geral da Assembleia Legislativa, Tscharles Tschá, afirmou que foi afastado pelo deputado Guilherme Maluf (PSDB) das reuniões que discutiram o convênio entre o órgão e a Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual (Faespe), no valor de R$ 100 milhões, após discordar de vários pontos da minuta do convênio
A revelação foi feita durante depoimento ao Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), no dia 30 de junho. O deputado, todavia, negou a acusação (veja em nota abaixo).
O convênio em questão é um dos objetos de investigação do Gaeco na ação penal derivada da Operação Convescote, que apura suposto desvio de mais de R$ 3 milhões dos cofres públicos, por meio de convênios firmados entre a Faespe e a Assembleia, Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), Secretaria de Estado de Infraestrutura e Prefeitura de Rondonópolis, entre 2015 e 2017.
A fundação, segundo a denúncia, criava “empresas fantasmas” para simular a prestação de serviços. O convênio possui valor de R$ 100 milhões, sendo que R$ 56 milhões já foram pagos pelo Legislativo.
Na ação, Tscharles e mais sete réus são acusados de falsidade ideológica por, em tese, terem atestado os serviços fictícios que a Faespe prestava à Assembleia. Tschales também foi citado pelo delator da operação, Hallan Freitas, como um dos beneficiários do esquema. O delator disse que chegou a entregar um envelope com dinheiro nas mãos de Tschales.
O ex-secretário, no depoimento, afirmou que de janeiro de 2015 a fevereiro de 2017, atuou como secretário-geral do órgão, por indicação da Mesa Diretora, então presidida por Maluf, atual 1º secretário da Mesa Diretora.
Tschales relatou que havia uma comissão para fiscalizar as atividades da Faespe e que, apesar de não integrar tal comissão, chegou a atestar a prestação de serviços da fundação, mesmo não verificando item por item.
“Certifiquei a prestação dos serviços por ter ciência que as empresas estavam efetivamente prestando serviços na ALMT, porém não identificava item a item dos relatórios, até porque eram bem genéricos e tinha dificuldade em distinguir quem seriam as pessoas físicas prestadoras dos serviços constantes das notas”.
O ex-secretário disse que na época em que a minuta do convênio entre a Faespe e a Assembleia estava sendo elaborada, foi chamado para acompanhar a confecção da mesma, junto com outros servidores.
Tscharles contou que, durante essas reuniões, discordou de alguns pontos especificados no documento. Nas tratativas, segundo ele, estavam presentes a reitora da Unemat, cujo nome não se lembra, o deputado Guilherme Maluf, um advogado de nome “Mello” e outras pessoas.
“Eu discordei de vários pontos, como o modelo de relatório de prestação de contas por entender que era muito genérico; também questionei a duração e valores do convênio, além de outros pontos como o pagamento de 10% dos valores à Faespe por conta do gerenciamento do convênio”.
A discordância de Tscharles, todavia, não teria agradado ao então presidente da Assembleia.
“Por conta disso fui afastado de participar das reuniões acerca da confecção do convênio pelo então presidente da ALMT, Guilherme Maluf, em uma reunião em que também estava presente o advogado Mello”.
De acordo com Tscharles, os questionamentos feitos por ele não foram registrados na ata de reunião, “mas as pessoas que estavam nas reuniões presenciaram estes fatos”.
“Inclusive, durante a execução do convênio, quando questionei algumas vezes sobre o fatos dos relatórios serem muito genéricos, fui informado pela Mesa Diretora que seguiam o modelo constante do convênio”, alegou.
Ainda no depoimento, o ex-secretário negou ter ordenado para a servidora Drieli Ribas assinar as notas e relatórios de serviços da Faespe sem fazer a devida verificação.
Tscharles argumentou que apenas entregou os relatórios a esta servidora, uma vez que os serviços eram relacionados com a atividade da mesma, “mas se ela atestou a execução do serviço foi por conta e responsabilidade dela”.
“Me recordo de uma situação em que pedi para ela assinar um relatório de atividade e nota porque era uma questão afeta diretamente a função por ela exercida, que foi a situação do projeto de alvará de incêndio do Corpo de Bombeiros, cujo serviço foi contratado pelo convênio da Faespe e o interrogando tinha plena ciência de que efetivamente o serviço foi prestado”, afirmou.
Veja fac-símile de trecho do depoimento:
Outro lado
Já o deputado Guilherme Maluf, em nota, negou que tenha vetado a participação de Tscharles Tschá da elaboração do convênio com a Faespe.
"O parlamentar ponderou ainda que na função que ocupava à época não existia possibilidade de Tscharles não participar do processo administrativo interno do contrato", diz trecho da nota.
O primeiro secretário da ALMT ainda afirmou que não acredita que tenha havido dolo na atuação dos servidores do Poder Legislativo na execução do convênio "e que a Casa de Leis apura por meio de uma auditoria especial interna todo o convênio com a fundação".
Operação Convescote
Conforme a denúncia do MPE, um grupo teria constituído uma organização criminosa “estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas”.
A organização teria o objetivo de se apropriar ilicitamente de recursos públicos da Assembleia e do TCE, “bem como que, em continuidade delitiva, ocultaram e dissimularam a natureza, origem e propriedade dos valores provenientes de infração penal (lavagem de capitais)”.
Para tal, eles teriam cooptado e/ou criado empresas fantasmas para celebrarem contratos fictícios de prestação de serviços com a administração púbica, e, com isso, ilicitamente desviaram recursos por meio da Faespe.
O MPE apontou como líder do esquema Marcos José da Silva, que, à época, ocupava a função de secretário-executivo de Administração do TCE e tinha sob o seu comando o Núcleo de Gestão de Contratos, Convênios e Parcerias, que é o setor responsável pela administração de todos os convênios, contratos e instrumentos congêneres.
Segundo o MPE, em virtude do cargo, Marcos José detinha o poder/dever de fiscalizar e administrar o convênio firmado entre a Faespe e o TCE, “fato que lhe permitia escolher e determinar quais ‘empresas fantasmas’ prestariam serviços fictícios para o órgão”.
As empresas usadas para o esquema pertenciam a Marcos Moreno Miranda, João Paulo da Silva Queiroz, Hallan Gonçalves de Freitas, Jocilene Assunção (esposa de Marcos José e diretora da Faespe), Karinny Oliveira, Luiz Benvenuti, José Carias Neto (irmão de Marcos José) e Antonio Pita Sassioto.
“As referidas empresas, além de não possuírem nenhum empregado, tinham como única fonte de receita o convênio/contrato com a Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual (Faespe) excetuando-se, nesse pormenor, as empresas H. G. de Freitas – ME e Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira – ME, que receberam, também, dinheiro de outras fontes, como Associação Plante Vida e F.B. de Freitas”.
A denúncia destaca que, de 2015 a 2017, os denunciados desviaram R$ 3 milhões dos cofres públicos por meio do esquema.
Prisões
Foram alvo de mandados de prisões preventivas: Cláudio Roberto Borges Sassioto, Marcos Moreno Miranda, Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira, José Carias da Silva Neto Neto, Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira, João Paulo Silva Queiroz, José Antônio Pita Sassioto, Hallan Gonçalves de Freitas, Marcos José da Silva, Jocilene Rodrigues de Assunção e Eder Gomes de Moura.
Dos presos, oito já conseguiram deixar a cadeia. Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira, Jocilene Rodrigues de Assunção, Marcos Moreno Miranda e José Carias Neto tiveram as prisões preventivas convertidas em domiciliares, por decisão da juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital.
João Paulo Silva Queiroz conseguiu liberdade com tornozeleira eletrônica, também por decisão da magistrada.
Luiz Benvenutti foi solto com cautelares mais leves, como a de comparecer mensalmente à Justiça, e Eder Gomes de Moura conseguiu a liberdade sem nenhuma cautelar. Hallan Freitas também conseguiu soltura com seis cautelares, entre elas o uso de tornozeleira.
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