O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), apontou inconsistências no bilhete escrito à mão pelo empresário João Gustavo Ricci Volpato, apontado como principal beneficiário do suposto esquema de desvio de recursos da conta única do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
No documento, Volpato tenta isentar a mãe, Luiza Rios Ricci Volpato, e o irmão, Augusto Frederico Ricci Volpato, de qualquer responsabilidade sobre as empresas Labor Fomento Mercantil (Labor FM) e RV Cobrança, investigadas na Operação Sepulcro Caiado. Ele afirma que a gestão era de sua responsabilidade exclusiva.
Em decisão desta quinta-feira (7), na qual manteve a prisão dos irmãos e outros cinco investigados, Villas Bôas destacou que a assinatura do bilhete é “bem diferente” daquelas encontradas em outros documentos assinados por João Volpato nos autos, inclusive aqueles apresentados pela própria defesa.
“Em primeiro lugar, conforme destacado pelo Ministério Público Federal, ‘uma declaração particular e unilateral, sobretudo firmada por familiar direto e coinvestigado, carece de confiabilidade objetiva e não possui fé pública’. Ademais, ‘esse tipo de documento pode ser facilmente manipulado ou fabricado, sendo incapaz de sustentar, por si só, a veracidade material dos fatos alegados’”, escreveu.
“Aliás, percebe-se que a assinatura lançada nessa declaração é bem diferente daquelas encontradas nos vários outros documentos assinados por João Volpato juntados aos autos e destacados pela própria defesa”, acrescentou.
Indícios contra o irmão
O ministro ressaltou ainda que informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontam Augusto Volpato como sócio-administrador da Labor FM, empresa de factoring e gestão de direitos creditórios, e atuante no setor de cobranças terceirizadas.
Para o ministro, mesmo que Augusto não praticasse atos ostensivos de gestão, isso não afastaria a possibilidade de participação no esquema.
Ele lembrou que grupos criminosos costumam utilizar “laranjas” para administrar empresas enquanto os verdadeiros controladores permanecem ocultos.
Villas Bôas citou ainda que planilhas e documentos indicam Augusto como beneficiário de valores desviados, na condição de sócio das empresas credoras em ações judiciais fraudulentas.
“Ainda, a decisão de primeiro grau afirma que o investigado Augusto Frederico Ricci Volpato foi apontado como braço operacional de João Gustavo Ricci Volpato, ressaltando-se que as suas movimentações bancárias destoam da sua capacidade financeira declarada, razão pela qual o COAF pontuou indícios da prática de lavagem de dinheiro", afirmou.
“Neste passo, vale lembrar que o combate ao braço financeiro é uma das formas mais eficazes de desarticulação de grupos criminosos, independentemente da sua caracterização como "organização criminosa" (art. 1°, § 1°, da Lei n° 12.850/2013). Afinal, o proveito econômico é o maior estímulo da criminalidade organizada”, acrescentou.
Veja o bilhete
Prisões mantidas
Além dos irmãos, o ministro manteve as prisões dos advogados Wagner Vasconcelos de Moraes, Themis Lessa da Silva, João Miguel da Costa Neto, Rodrigo Moreira Marinho e Régis Poderoso de Souza.
Na mesma decisão, o ministro concedeu prisão domiciliar para advogada e empresária Denise Alonso.
Ele atendeu um pedido dos advogados Valber Melo, Matheus Correa e Joao Sobrinho, sobre a condição de saúde da cliente, que passou por cirurgia recente e está em repouso médico.
Villas Bôas também manteve as domiciliares da mãe de João Volpato, Luiza Rios Volpato, e Melissa França Praeiro Vasconcelos de Moraes.
Além dos citados, o servidor do Tribunal de Justiça Mauro Ferreira Filho também foi alvo da operação. Ele se entregou nesta quinta, após 8 dias foragido.
A operação
Ao todo, a operação cumpriu 22 mandados de busca e apreensão, 16 ordens de bloqueio de valores que somam R$ 21,7 milhões, 46 quebras de sigilo bancário e fiscal, além do sequestro de 18 veículos e 48 imóveis. As diligências ocorreram em Cuiabá, Várzea Grande e Marília (SP).
Segundo as investigações, os suspeitos ajuizavam ações de cobrança em nome de empresas e, sem o conhecimento das partes rés, simulavam o pagamento das dívidas com comprovantes falsos de depósitos judiciais. Um servidor do TJMT, com acesso à conta única do tribunal, teria viabilizado o desvio ao migrar os valores para contas vinculadas aos processos fraudulentos, liberando alvarás de forma ilegal.
Ao menos 17 processos, protocolados entre 2018 e 2022, estão sob análise. A metodologia usada para os desvios teria sido comprometida após o Tribunal alterar, em 2023, o sistema de repasse de valores.
A lista de vítimas inclui empresários e pessoas físicas, muitas das quais descobriram ações com dívidas quitadas ficticiamente, chegando a R$ 1,8 milhão em um dos casos — embora os débitos reais fossem inferiores a R$ 100 mil. Em um episódio considerado grave, uma pessoa interditada judicialmente teve seu nome utilizado no esquema.
Os envolvidos devem responder por organização criminosa, estelionato, falsidade ideológica, falsificação de documento, peculato, lavagem de dinheiro e outros crimes.
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