As investigações que resultaram na denúncia da 4ª fase da Operação Sodoma, ingressada pela promotora de Justiça Ana Cristina Bardusco, do Ministério Público Estadual (MPE), contou com a ajuda de seis membros da organização criminosa – cinco deles delatores.
Firmaram termos de colaboração premiada o ex-presidente do Instituto de Terras de Mato Grosso, Afonso Dalberto; o ex-presidente da Companhia Matogrossense de Mineração (Metamat), João Justino Paes de Barros; os empresários Filinto Muller, que atua em factoring, e Antônio Rodrigues de Carvalho, da Santorini Empreendimentos Imobiliários; e o advogado Gabriel Gaeta Aleixo.
Também colaborou com o MPE o ex-secretário de Estado de Indústria, Comércio, Minas, Energia e Casa Civil, Pedro Nadaf, que confessou os crimes.
O ex-presidente do Intermat, Afonso Dalberto
A nova denúncia aponta suposto esquema operado por meio do pagamento de uma desapropriação no Bairro Jardim Liberdade, em Cuiabá, no valor de R$ 31,7 milhões.
Do montante, metade (R$ 15,8 milhões) teria retornado aos participantes das negociações ilícitas.
Com as colaborações, os delatores poderão ter a pena diminuída em até 2/3 ou até mesmo receberem perdão judicial, caso sejam condenados. Porém, isso ficará sob a análise da juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital.
As colaborações
Afonso Dalberto: também delator da Operação Seven, que apura esquema de mesma natureza, o ex-presidente do Intermat contou ao MPE que as tratativas começaram no início de 2014, em um almoço com Silval Barbosa, o procurador aposentado Chico Lima e os ex-secretários Pedro Nadaf e Arnaldo Alves.
O delator afirmou que, posteriormente, se reuniu com Silval e disse que o Intermat não teria dinheiro para pagar a desapropriação, ocasião em que o então governador teria dito: "não se preocupe que isso eu resolvo".
Para legalizar o futuro pagamento da indenização, Afonso Dalberto, solicitou que a Sefaz, então comandada pelo secretário Marcel de Cursi, agilizasse recursos para garantir o repasse.
O ex-presidente do Metamat, João Justino
Entretanto, como na época o Intermat não possuía dotação orçamentária para fazer o pagamento, o então secretário de Estado de Planejamento, Arnaldo Alves Neto, teria ajustado dotação orçamentária suficiente para atender a demanda da indenização.
“Salienta, ainda, que, ao contrário do que exige a Lei, a indenização não estava prevista na lei orçamentária anual e que tal indenização só foi efetivada para atender os interesses escusos da organização”.
Afonso Dalberto disse que recebeu R$ 606,7 mil para auxiliar a organização criminosa a desapropriar a área de terra e, assim, conseguir metade do valor como “retorno” para ser dividido entre os membros.
João Justino: como adiantado em agosto pelo MidiaNews (leia AQUI), o ex-presidente da Metamat, João Justino, chegou a pedir para ser absolvido na ação da Operação Seven por estar firmando um acordo de colaboração premiada.
Na delação, João Justino admitiu que Pedro Nadaf lhe entregou R$ 1 milhão – dinheiro da propina destinado a Marcel de Cursi – para que ele comprasse em ouro.
O motivo do pedido, segundo Justino, era que ele costumava viajar para Peixoto de Azevedo (672 km de Cuiabá) e, naquele município, conseguia comprar ouro com deságio de 30%.
“Relatou João Justino que na primeira vez que providenciou a compra, Pedro Nadaf entregou-lhe em espécie o valor de R$ 150 mil, que correspondeu à compra de 1,5 kg de ouro e que na última vez lhe foi entregue o valor R$ 500 milreais, levando à compra de cerca de 8 kg de ouro, acreditando ter trazido no total cerca de 15 kg de ouro, que comumente era entregue ao Pedro Nadaf, mas em algumas oportunidades chegou a entregar pessoalmente ao próprio Marcel”.
Já na Operação Seven, João Justino contou ao MPE que repassou cerca de R$ 2 milhões em cheques a Marcel de Cursi mas, nesse caso, não sabia da origem ilícita dos valores.
Filinto Muller: o empresário é dono da SF Assessoria e Organização de Evento Eirelli –ME. Ele relatou que a empresa foi usada para fazer a lavagem do dinheiro
desviado, a mando do procurador aposentado Chico Lima.
A empresa foi aberta em nome de um “laranja” chamado Sebastião Faria, “pessoa humilde que aceitou figurar como proprietário”. Foi também feito um contrato de fachada com a empresa dona do terreno, a Santorini, para dar ares de legalidade aos R$ 15,8 milhões recebidos.
O advogado Gabriel Gaeta Aleixo
A função da SF Assessoria, segundo Muller, era o de lavar o dinheiro e, posteriormente, fazer os devidos repasses aos membros da organização criminosa.
Pela “ajuda”, o empresário teria recebido pouco mais de R$ 474 mil. Ele levou ao MPE documentos que comprovariam as transações ilícitas, e “ainda, a identificação de possíveis terceiros beneficiados no esquema”.
Gabriel Gaeta Aleixo: o advogado se envolveu no esquema após ser contatado pelo empresário Filinto Muller, uma vez que um jornalista estaria o extorquindo após descobrir que a empresa SF Assessoria estava em nome de laranja.
Gabriel Gaeta então sugeriu a elaboração de novo Contrato de Cessão Onerosa de Direitos, substituindo a SF Assessoria pela pessoa física de Filinto, “documento que foi confeccionado pelopróprio Gabriel Gaeta a pedido de seu amigo Filinto, com data retroativa a20/12/12”.
“Na mesma ocasião, também a pedido de Filinto, Gabriel Gaeta confeccionou Instrumento Aditivo ao Contrato de Cessão de Direitos, com dataretroativa à 05/02/14. A ideia era fazer documento em data posterior a avaliação do imóveldesapropriado e, desta forma, sacramentar que o valor da cessão correspondia aos R$ 15milhões recebidos por Filinto”.
Antônio Rodrigues de Carvalho: dono da Santorini Empreendimentos Imobiliários, o empresário Antônio Rodrigues de Carvalho corroborou a versão dos demais delatores.
Ele disse que o pedido para expropriar a área em troca de indenização tramitava desde 2011, mas só em 2013 começou a ter andamento.
Em janeiro de 2014, Antônio Carvalho contou que foi chamado em uma reunião com Chico Lima e Marcel de Cursi, ocasião em que Cursi lhe disse, de forma direta, “que o pagamentoda indenização pela desapropriação poderia ser feito por precatório ou por dinheiro,
mas que somente 50% desse valor ficaria com o empresário, pois os outros 50% deveriam retornar à organização criminosa”.
“[Cursi] Prosseguiu aduzindo ao empresárioque o pagamento poderia ser feito em até 12 parcelas, devidamente corrigido, alegando queno mercado o empresário não receberia mais do que os 50% pelo precatório”.
O ex-secretário chefe da Casa Civil, Pedro Nadaf
Antônio Carvalho acabou por aceitar a oferta, apesar de, além da propina, ter tido um prejuízo de ao menos R$ 5 milhões com a venda do terreno.
Pedro Nadaf: em sua confissão, Nadaf contou que ocultou R$ 1,5 milhão, recebidos a título de propina, com o empresário Alan Malouf, sócio do Buffet Leila Malouf, na Capital.
De acordo com Nadaf, o valor entregue a Alan era referente à sua parte no suposto esquema. No depoimento ao MPE, Nadaf disse que, além dele, o ex-secretário de Estado de Planejamento, Arnaldo Alves, também entregou a Alan Malouf parte do dinheiro que recebeu como participação na cobrança de propinas.
Os valores entregues ao empresário, segundo Nadaf, foram investidos e geraram lucro. “Como o interrogando tinha muita proximidade com o secretário Arnaldo, acabou descobrindo que ele, Arnaldo, iria guardar sua parte do dinheiro desviado nesse esquema com Alan Malouf, seu amigo pessoal. Por ele ter sido proprietário de factoring no passado, sabia investir e fazer o dinheiro render”, diz Nadaf.
Conforme o depoimento, Nadaf e Arnaldo se reuniram com Alan, que concordou em “aplicar” tais valores. “Restando combinado que ele (Alan) pagaria ao interrogando e Arnaldo o valor de 1% ao mês. Tendo Alan Malouf conhecimento da origem ilícita dos valores”, diz trecho do depoimento.
Nadaf ainda revelou à Defaz que os valores repassados a Alan foram feitos através de cheques e em espécie, todos eles recebidos pelo procurador aposentado Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, o Chico Lima, e pelo empresário e delator Filinto Muller.
Além disso, o ex-secretário disse que, atualmente, por conta da valorização, o montante entregue ao empresário já deve ter passado de R$ 1,7 milhão.
O ex-secretário declarou que, além de investir sua parte da propina, a negociação com Alan teve como objetivo ocultar o dinheiro que não tinha origem legal.
“O interrogando e Arnaldo deixaram os valores de propina com Alan Malouf com o intuito de esconder os valores recebidos de propina. Sendo que, no caso do interrogando, por não ter lastro patrimonial para guardar em sua conta e também por ter bloqueio judicial em suas contas”, diz outro trecho do depoimento.
À Defaz, Nadaf declarou que, nesta época, Alan ainda prometeu lhe pagar R$ 100 mil, "por tê-lo ajudado a receber propina de empresários para influir em atos
praticados no Governo atual, que irá melhor relatar em momento oportuno”.
Pedro Nadaf também disse que se lembra dos valores entregues pelo também ex-secretário Arnaldo Alves.
“Arnaldo entregou dinheiro do desvio desse esquema no Jardim Liberdade, em torno de R$ 700 mil, bem como da propina recebida da construtora Ampla para Alan Malouf, em torno de R$ 200 mil”, afirmou à Defaz.
Ainda em seu depoimento, Nadaf relatou ter entregado mais R$ 950 mil para Alan, com o intuito de quitar uma dívida que o ex-governador Silval Barbosa (PMDB) tinha com o empresário, pela realização da festa de sua posse do Governo do Estado, em 2011.
O montante teria sido levantado com dinheiro obtido de vários esquemas que operaram na gestão Silval (leia AQUI).
A Sodoma 4
Segundo as investigações, o empresário e delator Filinto Muller foi procurado pelo então procurador do Estado Francisco Andrade Lima Filho, o “Chico Lima”.
Chico Lima teria pedido que Filinto criasse uma empresa, em nome de um laranja, para possibilitar a lavagem de dinheiro da organização.
Esta empresa, segundo a Polícia, recebeu várias transferências bancárias da Santorini Empreendimentos, por meio do advogado Levi Machado de Oliveira, no intuito de “lavar” a propina.
A Polícia ressaltou que a Santorini tinha autorização para expropriar a área desde 1997, mas só em 2011, por meio do sócio Antônio Rodrigues de Carvalho, pediu que o Estado adquirisse a área pelo valor de R$ 37,1 milhões.
Porém, apenas no final de 2013, o então chefe de gabinete de Silval, Sílvio Araújo, encaminhou o pedido a Chico Lima, para que este elaborasse um parecer.
Segundo a Polícia, apenas 55 hectares (no valor de R$ 17,8 milhões) estavam aptos a serem desapropriados, mas a organização aumentou a área de terra a ser apropriada para 97,5 hectares, “a fim de obter lucro”.
O delator e sócio da Santorini, Antônio Rodrigues de Carvalho, contou que, em janeiro de 2014, foi a uma reunião agendada com Chico Lima e o então secretário de Estado de Fazenda, Marcel de Cursi, na sede da Sefaz. Nesta reunião, segundo ele, Cursi exigiu que 50% do valor que seria pago pela desapropriação retornasse para o grupo criminoso.
Dias depois, de acordo com a representação, o à época chefe da Casa Civil, Pedro Nadaf, editou o decreto que autorizou a desapropriação da área, subscrito por Silval Barbosa.
Para legalizar o futuro pagamento da indenização, o então presidente do Intermat, Afonso Dalberto, solicitou que a Sefaz agilizasse recursos para garantir o repasse.
Entretanto, como na época o Intermat não possuía dotação orçamentária para fazer o pagamento, o então secretário de Estado de Planejamento, Arnaldo Alves Neto, teria ajustado dotação orçamentária suficiente para atender a demanda da indenização.
O próximo passo da organização, conforme a Polícia, foi a abertura de decretos orçamentários que viabilizaram créditos suplementares para a regularização fundiária.
Assim, entre maio e outubro de 2014, foram publicados sete decretos que possibilitaram que os R$ 31,7 milhões fossem pagos pela área. O ex-secretário Pedro Nadaf detalhou como foi feita a lavagem de dinheiro do esquema, durante depoimento em que confessou os crimes, trazendo cheques da empresa SF Assessoria emitidos a pessoas próximas.
No esquema, Afonso Dalberto disse que se beneficiou de R$ 606,4 mil. Já o delator Filinto Muller relatou que Chico Lima ajustou com ele que os R$ 15,8 milhões do “retorno” seriam lavados por meio da empresa dele, a SF Assessoria.
As investigações também apontaram que o advogado Levi Machado de Oliveira recebeu uma “comissão” de 3% do montante (R$ 474 mil) para colaborar nas tratativas.
Ainda segundo a Polícia, era Chico Lima o responsável por definir quais membros receberiam as propinas oriundas dos desvios. Além dele próprio, também seriam beneficiários: Silval Barbosa, Pedro Nadaf, Marcel de Cursi, Arnaldo Alves e Afonso Dalberto.
A propina recebida por Nadaf e Arnaldo, por outro lado, teria sido lavada com a ajuda do empresário Alan Malouf, sócio do Buffet Leila Malouf. Já a parcela de Silval Barbosa, no valor de R$ 10 milhões, teria sido integralmente repassada ao empresário de factoring Valdir Piran, a título de pagamento de dívidas de campanha.
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