A juíza Célia Regina Vidotti, da Vara de Ação Civil Pública e Ação Popular de Cuiabá, julgou improcedente uma ação que acusava a juíza Milene Aparecida Pereira Beltramini Pullig, da 3ª Vara Cível de Rondonópolis (212 km ao Sul de Cuiabá), da prática de improbidade administrativa.
A decisão foi proferida na última segunda-feira (2).
Milene Pullig foi acusada pelo Ministério Público Estadual (MPE) de ter contratado seu marido, Hitler Pullig Filho, e sua irmã Milaine Cristina Pereira Beltramini Pinheiro como assessores de gabinete, na época em que era lotada na comarca de Tangará da Serra (239 k a Noroeste da Capital).
O MPE alega que o marido e a irmã da juíza (que também foram inocentados) recebiam seus salários sem trabalhar, nas funções de agente de segurança e secretária, respectivamente.
Tanto o marido quanto a irmã da juíza, segundo o MPE, residiam longe da comarca: Milaine morava no município de Americanas (SP), enquanto Hitler cursava a faculdade de Direito na Unic, em Cuiabá.
“A magistrada permitiu e facilitou que os servidores se locupletassem ilicitamente, o que ensejou, considerando os valores recebidos a título de salários pagos,
enriquecimento ilícito”, diz trecho da ação.
Os danos aos cofres públicos causados pela suposta contratação “fantasma”, conforme o MPE, ultrapassariam R$ 224 mil.
Em sua defesa, a juíza Milene Beltramini afirmou que, na época das contratações, o Tribunal de Justiça não exigia comprovante de presença dos servidores comissionados nas dependências do fórum, “até porque esses servidores laboram jornada muito superior a dos demais servidores”.
Milene Beltramini ainda afirmou que não há provas de que os servidores não compareciam ao trabalho.
De acordo com ela, as testemunhas que apontaram as irregularidades possuíam desafetos com a mesma e “foram inquiridas de forma tendenciosa”.
Depoimentos favorecem defesa
Ao inocentar Milene Beltramini e os demais réus, a juíza Célia Vidotti afirmou que o MPE não conseguiu comprovar os atos de improbidade atribuídos aos réus.
Vidotti concordou com o argumento da defesa, relatando que na época dos fatos o TJ-MT não exigia o registro de ponto dos servidores ocupantes de cargos em comissão de secretário e agente de segurança.
“Conforme as atividades que lhes eram incumbidos desenvolver, muitas vezes se iniciava antes do expediente forense e ultrapassava o seu término, tudo para atender as necessidades dos magistrados e lhes propiciar o mínimo de segurança e organização para que pudessem desenvolver suas atividades jurisdicionais”, disse.
Os depoimentos de diversos servidores que trabalharam com Milene Beltramini na época dos fatos também foram utilizados por Célia Vidotti para embasar a decisão.
A promotora de Justiça Lindinalva Rodrigues, que confirmou que os servidores atuavam no Judiciário
Um dos relatos é o da promotora de Justiça Lindinalva Rodrigues, que atua na Capital. Ela contou que, entre os anos de 1999 e 2000, trabalhou com a juíza Milene Beltramini e chegou a conhecer a irmã dela, Milaine Beltramini.
“Afirmou também que via os requeridos Milaine e Hitler no fórum, trabalhando no gabinete e, por vezes, na secretaria da Vara. Relatou que seu ex-marido era amigo do requerido Hitler e ambos eram estudantes de direito, cursavam a faculdade em outra cidade, pois em Primavera não tinha o curso e ambos viajavam para estudar, inclusive, várias outras pessoas faziam isso, havia até transporte específico – van – para conduzir os alunos para a faculdade”, diz trecho do depoimento.
O advogado André Luiz da Silva Araújo, que foi ex-presidente da OAB em Primavera do Leste, também garantiu que Milaine Beltramini e Hitler Pullig prestavam serviços ao Judiciário.
“Ia muito ao fórum e ali, via a requerida Milaine com frequência, tanto na secretaria quanto no gabinete. Também via o requerido Hitler, ora no gabinete, ora na portaria e também chegando ao fórum junto com a Dra. Milene, ora requerida. Disse ter conhecimento que o requerido Hitler fazia faculdade em Cuiabá, ele viajava de carro e acha possível fazer esse trajeto para estudar, porque já fez isso no trabalho de advogado”, relatou.
Outros servidores e advogados confirmaram terem visto a irmã e o marido da juíza no exercício da profissão. Também depôs em favor de Milene Beltramini o juiz Luis Aparecido Bortolussi Junior, que atua na mesma vara de Célia Vidotti.
“Relatou que também jurisdicionou a Comarca de Pontes e Lacerda na mesma época que a Dra. Milene, ora requerida, e se recorda de ter conhecido a requerida
Milaine no trabalho no fórum. Pouco tempo depois, também conheceu o requerido Hitler”, afirmou.
Sem provas
Com base nos depoimentos e em gravações dos servidores no exercício do trabalho, a juíza Célia Vidotti afastou a tese de que teria ocorrido improbidade por parte dos réus.
Segundo Vidotti, as provas mostraram que Hitler Pullig trabalhava na Comarca e depois se deslocava para a faculdade. Ainda ficou provado, de acordo com a juíza, que a irmã de Milene não residia em Americana (SP), mas sim em Mato Grosso.
“Também restou demonstrado, pela prova testemunhal, que era a genitora das requeridas Milene e Milaine que residia na cidade de Americana/SP e quando esta adoeceu, a requerida Milaine se deslocou até referida cidade para cuidar de sua mãe, porém, por curtos períodos de tempo”, ressaltou.
Vidotti afirmou que os depoimentos ainda mostraram que as testemunhas que apontaram as irregularidades tinham problemas com a juíza Milene Beltramini.
“A testemunha Maristela Claro, advogada, quando ouvida em Juízo, afirmou que a testemunha João Batista nunca simpatizou com a Dra. Milene, ora requerida, inclusive, pronunciou-se contra a postura rígida da magistrada na rádio local. Já a testemunha Joaquim Neto, também advogado, disse ter conhecimento que a testemunha João Batista encabeçou um abaixo-assinado desfavorável a Dra. Milene, e chegou a ser consultado por terceiros se o assinaria, ao que respondeu negativamente”, diz trecho da decisão.
Desta forma, a juíza entendeu que, pela falta de provas de improbidade e de prejuízo aos cofres públicos, os réus deveriam ser inocentados.
“Não restou provada a ocorrência de prejuízo ao erário, enriquecimento ilícito, ofensa aos princípios constitucionais administrativos, tampouco condutas eivadas de dolo ou ao menos culpa grave que pudesse corroborar a pretensão condenatória deduzida na inicial [...] Diante do exposto, julgo improcedentes os pedidos e, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil e, por consequência, declaro extinto o processo, com julgamento do mérito”, decidiu.
A decisão ainda é passível de recurso.
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