Às vésperas da COP30, que começa nesta segunda-feira (10), em Belém (PA), a secretária de Estado de Meio Ambiente, Mauren Lazzaretti, afirmou que Mato Grosso chega ao evento com resultados concretos na conciliação entre ampla produção e preservação ambiental.

Na conferência mundial, segundo Mauren, o estado pretende “devolver a cobrança” aos países que mais emitem gases de efeito estufa e mostrar ao mundo que é possível produzir e conservar, como é feito em Mato Grosso.
“É hora de devolver a cobrança e não ficar numa condição passiva de aceitar a culpa pelo aquecimento global, porque ela não é do Brasil, e não é do estado de Mato Grosso”, disse Mauren ao MidiaNews.
“Nós ainda preservamos 60% do nosso território. Se fôssemos um país seríamos o oitavo maior produtor de alimentos do mundo, mas a nossa produção tem responsabilidade ambiental”, completou.
Mauren também destacou que esta deve ser a “COP da implementação”, cobrando recursos efetivos dos países ricos para financiar a descarbonização e apoiar projetos de restauração ambiental em estados que já cumprem metas de preservação.
“É muito fácil para um país em desenvolvimento manter as suas emissões, a sua matriz econômica, para esse modelo de produção que não é sustentável e faz um investimento ínfimo em outros países e diz que com isso ele está balanceando as suas emissões. Não é verdade! A gente precisa ser mais contundente na exigência de implementações reais”, afirmou.
Ao MidiaNews, a secretária ainda falou sobre o avanço do programa MT Carbono Neutro, o projeto de tokenização florestal que prevê US$ 100 milhões em investimentos, a meta de desmatamento ilegal zero até 2030, redução de áreas de pastagem com ganho de produtividade e as ações de monitoramento e combate ao desmatamento químico no Pantanal.
Confira principais trechos da entrevista:
MidiaNews – Secretária, gostaria que a senhora falasse sobre o projeto de Mato Grosso para a COP30, que acontece aqui no Brasil este ano e pode ser um evento histórico.

Mauren Lazzaretti – Mato Grosso tem uma participação sempre representativa nas COPs. Nós entendemos que é uma oportunidade ímpar de levar ao mundo as iniciativas que dão certo e as oportunidades de parcerias.
Por mais que tenhamos políticas públicas consistentes, nem sempre o mundo lá fora consegue visualizar e entender o que o Centro-Oeste, um estado subnacional, tem feito para conciliar produção e sustentabilidade. Nosso projeto é mostrar os resultados, principalmente os acumulados nos últimos anos, e destacar parcerias que ainda podem ser estabelecidas com instituições internacionais, porque o foco da COP é justamente esse diálogo interinstitucional entre países, estados subnacionais e o Brasil.
MidiaNews – No fim do mês passado, a Sema esteve na Assembleia e apresentou algumas metas, com destaque para o programa MT Carbono Neutro, que tem previsão de ser implementado até 2035. Como está esse projeto?
Mauren Lazzaretti – Isso é uma conjunção de vários fatores. Sempre destacamos que a meta do Governo do Estado é fomentar políticas públicas que promovam a descarbonização — o que chamamos de trajetória de descarbonização. Mas isso envolve investimentos. Hoje, esses investimentos são essencialmente realizados pelo poder público, pelo Governo do Estado, e pelo setor privado que está engajado com a pauta.
O setor produtivo, de modo geral, também tem compromissos voluntários relacionados à descarbonização da cadeia produtiva.
Mato Grosso tem 12 ações estratégicas dentro do programa, todas alinhadas a projetos e programas em andamento: combate ao desmatamento ilegal, fomento ao manejo florestal, biocombustíveis, etanol de milho, integração lavoura-pecuária-floresta, estímulo ao reflorestamento para fornecimento de biomassa e para restaurar áreas de preservação permanente.
Para todas essas ações, temos programas estruturados, que serão apresentados na COP30 com dois objetivos: mostrar a evolução já alcançada e reforçar a busca por parcerias. Um exemplo é o manejo florestal sustentável, que depende essencialmente do governo e do setor privado: a meta até 2030 é chegar a 6 milhões de hectares manejados — pois o manejo protege a floresta e gera renda, apenas colhendo árvores maduras. Já alcançamos 5,2 milhões de hectares.
Mas temos outras estratégias que precisam de investimentos, como a restauração. O programa Todos pelo Araguaia prevê restaurar 5 mil hectares, mas precisamos de investimento estrangeiro. Até hoje, os aportes internacionais ainda são muito tímidos, insuficientes. Esta é a COP da implementação.
O que se espera desta COP? Que os países com maior emissão e responsabilidade ambiental possam efetivamente fomentar essas parcerias e aportar recursos. Se esses recursos não vierem, é possível que o Estado, sozinho, não consiga atingir a meta de descarbonização até 2035.
Yasmin Silva/MidiaNews
"O nosso esforço é criar um ambiente de políticas públicas favoráveis, o engajamento do setor produtivo e isso atrair investimentos estrangeiros", disse secretária
No entanto, o nosso esforço é criar um ambiente de políticas públicas favoráveis, o engajamento do setor produtivo e isso atrair investimentos estrangeiros.
MidiaNews – A senhora firmou, em setembro, em Nova York, uma negociação de 100 milhões de dólares. Como funciona o pagamento desse recurso para manter a floresta em pé?
Mauren Lazzaretti – O projeto que firmamos em Nova York é inovador, um piloto no mundo. Trata-se da tokenização para manutenção da floresta. Normalmente, o que vemos são iniciativas voltadas ao carbono e à restauração de áreas. Esta é uma modelagem totalmente diferente, que envolve investimentos bancários exclusivamente para a manutenção de florestas em áreas públicas.
No nosso caso, o projeto envolve o Parque Cristalino, mas ele depende da venda dos tokens. O que lançamos em Nova York foi justamente a tokenização, colocando esses tokens na bolsa para serem comercializados. A empresa iniciou as transações, e o desembolso será realizado ao longo de 30 anos.
Os primeiros 15 milhões de dólares — cujo destino é de livre definição pelo Governo do Estado, mas com o compromisso do governador de que serão aplicados na agenda ambiental — devem ser liberados até o fim de 2026. Os outros 85 milhões (não 70) serão distribuídos ao longo dos 30 anos de vigência do acordo. Ou seja, não se trata de um desembolso imediato de 100 milhões de dólares.
O compromisso do Governo do Estado é manter a unidade de conservação. Esse já é um dever legal, mas, agora, passa a ser também um compromisso político reforçado. A expectativa é que, conforme as transações forem avançando, possamos divulgar a evolução desses investimentos em Mato Grosso.
MidiaNews – E quanto aos países? Costuma-se dizer que seria justo que os grandes emissores de gases de efeito estufa paguem para nações como a nossa, que mantêm a floresta em pé. A senhora percebe disposição desses países em desembolsar recursos?

Mauren Lazzaretti – Eu ainda acredito que a narrativa é muito mais forte do que a prática. Nós percebemos, sim, algumas iniciativas importantes e válidas, como o Fundo LIFE para carbono e algumas parcerias que Alemanha e Reino Unido, por exemplo, têm firmado com estados como Mato Grosso.
No entanto, ainda são ações em escala muito reduzida, que não enfrentam o problema central. Durante as COPs, nós também enfrentamos o desafio de desconstruir a narrativa de que o desmatamento é o grande responsável pelas emissões e pelo aquecimento global. Do ponto de vista técnico-científico, essa não é a principal contribuição.
Claro, não estamos dizendo que o desmatamento não contribui — ele representa cerca de 4% do total das emissões. Mas quando lembramos que cinco países do mundo são responsáveis por mais de 65% das emissões, estamos dizendo que são esses países, ricos e com grande desenvolvimento industrial, que efetivamente fazem diferença na balança climática global.
E esses países não têm compromissos realmente consistentes e em escala suficiente para reverter o cenário. Basta observar que China e Estados Unidos sequer vão participar da COP e não apresentam metas tão firmes de redução, nem investimentos compatíveis com sua responsabilidade nas emissões globais.
Eu ainda entendo que, nesses espaços, os resultados alcançados são muito menores do que os necessários para realmente reverter a curva do aquecimento global.
MidiaNews - Qual seria a solução na visão da senhora?
Mauren Lazzaretti - A solução é continuar falando sobre o tema, mas a cobrança tem que ser consistente. Por isso que nós, Mato Grosso, em todas as oportunidades, nós destacamos o nosso compromisso ambiental com a nossa produção sustentável, mas não perdemos a oportunidade de dizer que se todos os países do mundo fizessem como Mato Grosso, a realidade não seria essa.

É devolver a cobrança e não ficar numa condição passiva de aceitar a culpa pelo aquecimento global porque ela não é do Brasil, não é do estado de Mato Grosso. Nós ainda preservamos 60% do nosso território. Se fôssemos um país, seríamos o oitavo maior produtor de alimentos do mundo, mas a nossa produção tem responsabilidade ambiental.
Qual outro país do mundo tem essa mesma responsabilidade ambiental associada à sua produção? É muito fácil para um país em desenvolvimento, mantém as suas emissões, mantém a sua matriz econômica para esse modelo de produção que não é sustentável e faz um investimento ínfimo em outros países e diz que com isso ele está balanceando as suas emissões. Não é verdade! A gente precisa ser mais contundente na exigência de implementações reais.
MidiaNews - MidiaNews – Um desses planos para o Estado prevê, até 2030, a redução da área de pastagens. Hoje, 23% do território é ocupado por pastagens, e a meta é reduzir para 17%. Como isso será possível?
Mauren Lazzaretti – Um dos diferenciais de Mato Grosso é investir em tecnologia e em insumos mais eficientes para aumentar a produtividade e reduzir o uso da terra. Isso está entre as 12 ações prioritárias do programa Carbono Neutro, dentro do estudo que chamamos de trajetória de descarbonização.
E o que essa trajetória envolve? Maior eficiência. A eficiência mostra que é possível manter ou até ampliar o rebanho bovino com pastagens de alta qualidade, integrando lavoura, pecuária e floresta. Com isso, ampliamos a produção do Estado sem aumentar a área produtiva. É absolutamente possível.
Com que tipo de investimento? Em pesquisa, confinamento e semiconfinamento, intensificação no fim do ciclo para o abate e melhoria genética das sementes. Mato Grosso tem um histórico muito exitoso em ampliar produtividade reduzindo abertura de novas áreas. Esse é o objetivo: continuar investindo em tecnologia, aumentar a produtividade e, ao mesmo tempo, ampliar nossa capacidade de manter o clima, restaurando áreas que historicamente foram desmatadas de forma equivocada. Isso aconteceu, reconhecemos isso, mas o Estado tem estratégia para todas essas frentes — e o setor produtivo também está engajado.
O importante para o setor produtivo é manter o clima. Para isso, ele precisa manter floresta e garantir água. A produção de água depende da restauração de áreas de preservação permanente, da mata ciliar. Ele não quer reduzir produtividade, então investe em tecnologia para aumentá-la.
MidiaNews – Secretária, e um dos projetos também prevê desmatamento ilegal zero até 2030. Isso não está longe demais? Não deveríamos antecipar essa meta?
Mauren Lazzaretti – Sem dúvida, o desmatamento é um grande desafio, assim como o crime em geral é um desafio para todos os países. Desmatamento ilegal é crime. Combater o crime deveria ser para ontem, mas precisamos ser realistas: é necessário construir uma trajetória para reduzir o desmatamento ilegal.
Yasmin Silva/MidiaNews
"Nós focamos em tecnologia, então nosso monitoramento por satélite é diário e as nossas equipes têm planejamento para combater o ilícito", disse Mauren
Em Mato Grosso, quando olhamos os últimos sete anos, vemos um aumento significativo da legalidade. Saímos de pouco mais de 3% ou 4% de desmatamento legal e chegamos a cerca de 50%. Isso oscila conforme o período, podendo cair para 40%, 37%, 36%. Mas estamos falando de multiplicar por seis o percentual de desmatamento lícito em relação ao que tínhamos em 2018 e no início de 2019.
Ao mesmo tempo, somos reconhecidos pelo programa Brasil Mais, do Ministério da Justiça, e pelo MapBiomas como o estado brasileiro com melhor performance no combate ao desmatamento ilegal.
Investimos fortemente em tecnologia: nosso monitoramento por satélite é diário, nossas equipes atuam com planejamento e retiramos regularmente maquinário ilegal. Essas estratégias, somadas a um licenciamento mais eficiente, têm mudado nossa trajetória.
Mas não é possível sair de 97% de ilegalidade e, em três ou quatro anos, zerar completamente esse cenário. Por isso a meta de 2030: ela estabelece um horizonte realista, com foco em alterar comportamentos sociais por meio de duas frentes — um licenciamento mais ágil e eficiente e, ao mesmo tempo, um combate mais firme ao ilegal.
MidiaNews – E essas políticas e legislações de repressão funcionam? A aplicação de multas, prender o produtor...

Mauren Lazzaretti – Não. Sejamos bem honestos: o que realmente desmotiva o infrator são os embargos econômicos. Autuar, embargar e apreender maquinário são passos importantes, mas o que pesa de fato é quando instituições financeiras deixam de conceder crédito, quando empresas com políticas de compliance deixam de comprar desses produtores e quando a comercialização se torna inviável. São os prejuízos econômicos que levam o infrator a buscar a regularização.
E do ponto de vista do Estado, como não existe pena de morte nem para crimes hediondos, criamos um ambiente em que, mesmo quem comete o ilícito tem a possibilidade de regularização — mas precisa assumir compromissos. No caso do desmatamento, se a área é passível de uso, ele terá que pagar multa e realizar reposição florestal obrigatória. Só depois poderá ter o desembargo.
Se a área desmatada for de preservação permanente ou reserva legal, ele terá que recuperar. Uma vez cumpridos esses compromissos, devolvemos a legalidade e ele pode continuar produzindo. Essas estratégias têm efeito pedagógico. Mas, sem dúvida, ainda precisamos de uma legislação mais rígida, que imponha prejuízos reais e mais rápidos ao infrator.
Um exemplo claro é o Pantanal. Houve reiterados descumprimentos de embargos, e foi necessário adotar medidas além das administrativas para conseguir cessar o dano.
MidiaNews – No ano passado, o pecuarista Claudecy Oliveira foi alvo da Polícia Civil por desmatamento químico no Pantanal. Este ano, houve aumento de 800% nos alertas de desmate por agrotóxico no Estado. Como funciona essa ferramenta de monitoramento e por que ela é tão importante para Mato Grosso?
Mauren Lazzaretti – Quando o Estado passou, em 2019, a atuar de forma mais firme no combate ao desmatamento tradicional — aquele que utiliza maquinário, como correntões — percebemos uma mudança de comportamento dos infratores. Isso culminou no caso do pecuarista no Pantanal, em que se constatou o uso de agroquímico em larga escala.
A partir daí, focamos também na identificação desse tipo de desmatamento. Por quê? Para que essa nova modalidade não se tornasse uma prática sem repressão. É muito difícil identificar esse crime apenas em campo. É fundamental que os alertas indiquem onde nossas equipes devem atuar para coletar dados.

Quando falamos em aumento, na verdade estamos detectando de forma mais eficiente as alterações de vegetação. Elas podem, sim, representar desmatamento químico, mas também podem ser alterações causadas por outros fatores — inclusive por ações ilegais de um vizinho na propriedade ao lado. O que fazemos é monitorar essas mudanças e responsabilizar quem, de fato, for o autor do dano.
MidiaNews – E como funcionam essas multas? Os recursos vão para a Sema ou se diluem no caixa do Estado?
Mauren Lazzaretti – Todas as multas são destinadas ao Fundo Estadual de Meio Ambiente. Nós também promovemos mutirões de conciliação, buscando corrigir a infração no menor tempo possível. Isso geralmente resulta no pagamento da multa com alguns benefícios, porque o infrator assume compromissos de regularização e reflorestamento, o que reduz o valor, mas garante o pagamento imediato, sem judicialização e sem arrastar o processo por anos.
Todos esses recursos vão para o Fundo Estadual de Meio Ambiente e são revertidos em ações de fiscalização, monitoramento e na manutenção e melhoria das nossas unidades de conservação. Temos várias obras em andamento com recursos de conversão de multa.
Um exemplo são as melhorias nos parques Mãe Bonifácia, Zé Bolo Flô e Massairo Okamura. O Jardim Botânico também está entrando com um novo projeto em Chapada dos Guimarães. Há várias outras iniciativas que beneficiam diretamente a população, financiadas com recursos provenientes dessas conversões.
Yasmin Silva/MidiaNews
A secretária de Meio Ambiente, que disse que aumento de desmate químico é, na verdade, ampliação de identificação
MidiaNews – O Estado tem o programa PCI — Produzir, Conservar e Incluir. Queria que a senhora falasse um pouco sobre esse programa, que também deve ser apresentado na COP 30.
Mauren Lazzaretti — A PCI nasceu em 2015. Podemos dizer que ela é uma política de Estado, porque não é deste governo; é uma estratégia de Mato Grosso que envolve o poder público, o setor privado e a sociedade civil.
Na gestão do governador Mauro Mendes e do vice-governador Otaviano Pivetta, a PCI, que era apenas uma estratégia construída a várias mãos, se transformou no Instituto PCI. Em 2025, a PCI completa 10 anos. A ideia é compartilhar na COP as metas que foram estabelecidas em conjunto — setor produtivo, sociedade civil e poder público —, mostrar o que alcançamos e o que ainda precisa ser feito para atingir os objetivos até 2030.
Como o próprio nome diz, a PCI foca em produção, conservação e inclusão. Não trata apenas de preservação ambiental nem apenas de produção. Envolve todas as comunidades — indígenas, quilombolas, pequenos e grandes produtores e todas as cadeias produtivas, buscando soluções que conciliem produção e conservação.
Se pensarmos na mensagem que Mato Grosso quer levar à COP, é a de que é possível produzir conciliando meio ambiente e pessoas. Precisamos de desenvolvimento econômico, as pessoas sobrevivem da utilização dos recursos naturais , mas é possível usar esses recursos com parâmetros sustentáveis.

Esse é o conceito de desenvolvimento sustentável, presente nos ODS. Mas, na prática, como executar aquilo que é teórico? Mato Grosso dá exemplo.
A PCI mostra isso: como conciliar a pecuária com conservação? Recuperando pastagens degradadas, aumentando o potencial produtivo, integrando lavoura, pecuária e floresta e gerando biomassa. São estratégias consistentes que mostram que Mato Grosso conserva e produz.
MidiaNews — Esse discurso de preservação é muito bonito, mas o produtor rural tem aderido a ele? Eles entendem sua importância?
Mauren Lazzaretti — Todos os produtores — pequenos e grandes — têm essa consciência. O que ninguém aceita é discurso extremista. Existe uma consciência geral e eu cito um exemplo de assentamento em Barra do Garças.
Quando estivemos lá, para falar do programa Todos pelo Araguaia, o produtor entende que, sem mata ciliar na nascente, ele não tem água e, sem água, ele não produz. A questão é a linguagem. Ele não aceita que digam que ele não pode produzir, mas sabe que não adianta desmatar tudo, porque ele perde água e, consequentemente, produção.
A diferença está no equilíbrio. Os extremos dificultam qualquer convencimento.
MidiaNews — A senhora acha que a COP caminha para uma carta com esse discurso equilibrado?
Mauren Lazzaretti — Espero que sim. Estamos otimistas para que qualquer manifestação final esteja pautada na matriz real do desenvolvimento sustentável, que não é preservação exclusiva. É considerar o ser humano, gerar renda e conservar os recursos naturais. Essa é a matriz.
Além disso, temos que falar de implementação, e isso envolve recursos. Eu costumo brincar que não tem verde se a conta estiver no vermelho.
Não consigo discutir restauração com quem tem dificuldade para alimentar a família e cujo custo de recuperação ambiental supera seu ganho anual. Não basta discurso; é preciso solução economicamente viável.
E isso nos leva a outra questão: o consumidor está disposto a pagar mais por um produto sustentável? Porque produzir preservando custa mais. Aqui em Mato Grosso, preservamos até 80% da área em regiões de floresta. Isso precisa ser reconhecido.
O movimento global, no entanto, muitas vezes é o oposto, por exemplo, “não comprem da Amazônia”. Isso não ajuda a preservação. Sabemos que, quando há renda, há conservação; se não houver renda, o uso do recurso natural se torna inevitável para sobrevivência.
MidiaNews — Falar em pagar mais pode ser bonito para o europeu, mas a população brasileira é empobrecida. Como isso funciona aqui?
Mauren Lazzaretti — A população brasileira não cria embargos econômicos contra si mesma. Estou falando de embargos europeus — como o embargo à carne de áreas desmatadas após 2008. Essas restrições são impostas pelo exterior, não pelo Brasil.
Aqui defendemos o cumprimento do Código Florestal. Se cumprimos, já estamos fazendo nossa parte. O problema é lá fora, onde há movimentos para restringir produtos da Amazônia. Ora é moratória da soja em 2008, ora novas datas em 2018 ou 2020. Isso afeta diretamente nossa produção.
MidiaNews — Essa é tratada como a COP da implementação. Existe risco de o Brasil passar vergonha por não trazer China e EUA?

Mauren Lazzaretti — Não vejo isso necessariamente como culpa do Brasil. O desafio é global. Em todas as COPs, o foco é discutir investimentos para limitar o aquecimento a 1,5°C até 2050, e os resultados sempre ficam aquém. Se o Brasil conseguir avanços concretos, estará na vanguarda. Se não, estará no mesmo patamar dos demais países.
MidiaNews — Mato Grosso aprovou leis ambientais questionadas no STF, como a que limita criação de novos parques. Não é um contrassenso?
Mauren Lazzaretti — Não.
MidiaNews — Por quê?
Mauren Lazzaretti — Porque a proposta do Estado está relacionada à responsabilidade fiscal, social e ambiental. Em Mato Grosso, propriedades privadas preservam grande parte de suas áreas: 80% na floresta, 35% no Cerrado e 60% no Pantanal. Mas o problema maior é que o Brasil criou muitas “unidades de conservação de papel”, sem indenizar proprietários. Assim, elas não cumprem seu papel.
Defendemos a criação de unidades de conservação, mas com indenização prévia e estrutura para implementação. Inclusive assinamos um decreto de interesse público para 45 mil hectares no Pantanal, com fundo garantido para indenizar produtores antes da criação da unidade.
Criar a unidade exige implementá-la — ter posse da área — e isso historicamente não aconteceu.
MidiaNews — Um exemplo é o Parque Cristalino.
Mauren Lazzaretti — Sim. E também o Parque Ricardo Franco, Serra de Santa Bárbara e a Estação Ecológica do Rio Ronuro. São áreas criadas há mais de 20 anos e nunca indenizadas. O Estado defende a criação, mas da forma correta, e o decreto recente prova isso.
MidiaNews — Como está a situação do Cristalino?

Mauren Lazzaretti — Estamos discutindo com o Judiciário. Há uma comissão para buscar acordo. O compromisso do Estado é manter a unidade de conservação, avaliando o mecanismo legal adequado com MP, PGE e o Núcleo de Conciliação do TJ. O Parque Cristalino seguirá sendo uma unidade de conservação.
MidiaNews — O deputado Diego Guimarães criticou a queima de balsas em Peixoto de Azevedo. O que motivou a operação?
Mauren Lazzaretti — A queima é exceção, não regra. Sempre priorizamos apreender o maquinário. Mas há casos de reincidência ou impossibilidade de identificar o proprietário. A operação foi conduzida pela Polícia Civil, após longa investigação. Há base legal e decisões pacíficas do STJ e do STF. Em Peixoto ainda há muitos ilícitos e impactos ambientais significativos.
Reconhecemos a importância social da mineração, por isso incentivamos a regularização. Enquanto houver ilegalidade e reincidência, alguma medida deve ser tomada.
MidiaNews — Há críticas sobre burocracia na Sema. Há avanços?
Mauren Lazzaretti — Sim. Já tivemos licenças que levavam cinco ou dez anos. Hoje o Estado monitora os prazos. O licenciamento com EIA/RIMA leva menos de 12 meses; o simplificado, dois dias; e o trifásico, como o de mineração, cerca de 90 dias. 98% saem dentro do prazo legal de 180 dias.
O CAR ainda é um gargalo, mas já adotamos automação em 68 municípios e até março de 2026 serão 142. Desde 2020, com a LAC, criamos uma alternativa mais ágil, especialmente para pequenos e médios empreendedores, sem perder rigor técnico.
Veja íntegra da entrevista:
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