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28.11.2025 | 10h45 Tamanho do texto A- A+

TJ diz que advogado “desistiu” de feminicídio e anula condenação

Tribunal de Justiça também determinou a soltura de Nauder Júnior Alves Andrade; caso ocorreu em 2023

Reprodução

O advogado Nauder Andrade, que teve condenação anulada e liberdade concedida pelo Tribunal de Justiça

O advogado Nauder Andrade, que teve condenação anulada e liberdade concedida pelo Tribunal de Justiça

ANGÉLICA CALLEJAS
DA REDAÇÃO

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso anulou a condenação do advogado Nauder Júnior Alves Andrade, e determinou sua soltura. Nauder foi julgado pelo Tribunal do Júri em 30 de junho, e cumpria pena de 10 anos de prisão em regime inicial fechado pela tentativa de feminicídio contra a então namorada, em Cuiabá, em 2023.

 

Embora não se conheça, com exatidão, o motivo da interrupção, o que se extrai da narrativa da vitima é que a desistência partiu, de forma voluntária, do próprio apelante

A sentença foi relatada pelo desembargador Wesley Sanchez Lacerda, em sessão na terça-feira (25), e seguida pelo colegiado da Primeira Câmara Criminal. O despacho foi publicado na quarta-feira (26).

 

O ponto decisivo para a anulação veio na fase final do voto. Segundo o relator, o conjunto probatório e as inconsistências do julgamento demonstraram que o veredicto dos jurados foi manifestamente contrário às provas dos autos, o que exige novo julgamento.

 

No trecho que fundamenta a decisão, o desembargador afirmou que o depoimento da vítima, colhido em plenário, deixou claro que o réu interrompeu por conta própria a tentativa de feminicídio antes que o crime se consumasse. Conforme ele, não houve qualquer intervenção externa, impedimento de terceiros ou circunstância que o fizesse parar.

 

"Embora não se conheça, com exatidão, o motivo da interrupção, o que se extrai da narrativa da vitima é que a desistência partiu, de forma voluntária, do próprio apelante", escreveu o magistrado.

 

Segundo o desembargador, as provas do processo demonstraram que o réu poderia ter continuado com a agressão até chegar ao resultado fatal, mas optou por não fazê-lo. Ainda destacou que, na garagem onde tudo aconteceu, estavam apenas ele e a vítima, o que reforça que nada externo impediu a continuidade do ataque.

 

"O fato de o apelante, no curso das agressões, verbalizar expressões de ameaça ou intenção homicida não impede o reconhecimento da desistência voluntária, se posteriormente, por ato próprio e consciente, interrompe a execução, deixando de produzir o resultado fatal", analisou.

 

Para evidenciar a contradição entre o que ficou provado nos autos e o veredicto dos jurados, principalmente diante da ausência de testemunhas presenciais e do relato da própria vítima sobre a interrupção voluntária, o relator citou o quesito respondido pelo Conselho de Sentença que embasou a condenação por tentativa de homicídio. 

 

“4º Quesito: (...) o acusado deu início à execução de um crime de homicídio que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, em razão de a vítima ter conseguido se esquivar dele, fugir e ser socorrida por terceiros? 04 — SIM.”.

 

"Ora, a própria vitima, em plenário, foi clara ao afirmar que o apelante cessou voluntariamente as agressões e se afastou por iniciativa própria, o que permitiu, consequentemente, que ela buscasse socorro. Em nenhum momento, a vítima declarou que se esquivou", destacou o desembargador.

 

Assim, o TJ concluiu que o reconhecimento da tentativa de homicídio, como formulado no quesito aos jurados, vai na contramão das provas reunidas no processo.

 

O relator ressaltou que, embora o Conselho de Sentença tenha soberania para decidir, essa prerrogativa não significa infalibilidade, e cabe ao Tribunal intervir quando a decisão popular se distancia de forma evidente do que foi demonstrado nos autos.

 

"Assim sendo, impõe-se a anulação do julgamento e a submissão do apelante a novo júri, nos termos do art. 593, § 3º, d, do CPP. ", decidiu.

 

Com base nesse entendimento, o relator determinou a imediata soltura do advogado, mediante medidas cautelares diversas da prisão, como tornozeleira eletrônica, distanciamento da vítima e outras restrições.

 

“O apelante deverá submeter-se à monitoração eletrônica, está proibido de aproximar-se da vítima a menos de 500 metros, de manter contato por qualquer meio e de frequentar bares e boates, devendo ainda comparecer a todos os atos processuais".

 

O caso e o julgamento

  

O caso ocorreu em 18 de agosto de 2023, em um condomínio da Capital. Conforme a denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), a tentativa de feminicídio não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do réu, uma vez que a vítima conseguiu se desvencilhar, fugir e receber socorro a tempo. 

 

Os jurados reconheceram que o crime foi cometido por motivo fútil, mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, em razão da condição de sexo feminino da vítima e envolvendo violência doméstica e familiar.

 

Conforme a denúncia do MPE, o casal namorou por 12 anos e a relação sempre foi conturbada por conta do comportamento agressivo do advogado, que seria usuário de entorpecentes.

 

O casal estava na residência da vítima, dormindo, quando por volta das 3h da madrugada Nauder se levantou e foi até o banheiro, onde teria usado drogas, consta na acusação.

 

Ao voltar para o quarto, diz a denúncia, ele tentou manter relações sexuais com a vítima. Diante da recusa, Nauder teria passado a agredi-la com violentos socos e chutes, além de impedir por horas que ela saísse de casa.

 

Conforme o MPE, ele usou uma barra de ferro, que reforçava a segurança da porta da residência, e golpeá-la e enforcá-la. A vítima desmaiou e, ao retomar os sentidos, aproveitou a distração do namorado para fugir. 

 

Ela buscou socorro e foi levada para um hospital. Segundo o médico que a atendeu, “ela não morreu por ser forte, ou algo sobrenatural explica sua sobrevivência”.

 

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