O procurador de Justiça Domingos Sávio e o advogado Roberto Tardelli trocaram farpas, durante a sessão de julgamento da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), na tarde de quarta-feira (9).
Na ocasião, o órgão julgava o habeas corpus que pede a soltura do cliente de Tardelli, o ex-secretário de Estado de Fazenda, Marcel de Cursi, réu da Operação Sodoma.
O julgamento foi adiado em razão do pedido de vistas do desembargador Pedro Sakamoto.
Ao dar seu parecer sobre o caso, o procurador criticou o fato do advogado requerer que o TJ decretasse o sigilo da ação penal que investiga suposto esquema integrado por Cursi, que teria lucrado R$ 2,6 milhões, entre 2013 e 2014, por meio de cobrança de propina para a concessão de incentivos fiscais pelo Prodeic (Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso).
Domingos Sávio afirmou que Roberto Tardelli, na época em que atuava como promotor de Justiça em São Paulo, cargo que exerceu por 31 anos e do qual se desligou em 2014, tinha opinião diversa da que sustenta atualmente como advogado.
“Mostram-se muito oportunas e atuais as palavras do próprio defensor do paciente, Roberto Tardelli, que, em passado não muito distante, defendeu ardorosamente o princípio da publicidade e refutou as alegações daqueles que afirmam que os julgamentos se transformaram em espetáculos circenses que expõem impiedosamente o infortúnio dos réus”, disse.
O procurador citou trecho de artigo escrito por Tardelli , intitulado “A Transparência incomoda”, que foi publicado em 2006 no jornal Folha de S. Paulo.
Para Domingos Sávio, o título é bastante “sugestivo” em relação ao pedido feito pelo advogado em favor do ex-secretário.
“Não há espetáculo, não há circo quando se tenta aproximar das pessoas aquilo que é fundamentalmente delas. O que existe é um temor preconceituoso e corporativista de que, acendidas as luzes, a falsa moral comece a ruir, a pompa sem sentido comece a se tornar ridícula. E as pessoas comecem a identificar os verdadeiros operadores do Direito, sérios e vinculados com a construção de uma sociedade justa, fraterna e igualitária. A transparência que decorre do acesso público daquilo que se passa em um julgamento, em que não haja sigilosidade determinada por lei ou fundamentadamente pelo juiz, é parte do aprimoramento do processo democrático do país e essencial para a boa administração da Justiça”, diz trecho do artigo de Tardelli, citado pelo procurador.
Advogado rebate
Roberto Tardelli ironizou, durante sua sustentação oral, a citação feita por Domingos Sávio.
“Quero cumprimentar e agradecer meu ex-colega procurador de Justiça, que até citou um artigo. Foi um dos primeiros que eu publiquei, talvez de alguns milhares que o senhor deve ter lido. Na situação, o senhor o fez descontextualizadamente, é claro, mas muito obrigado pela referência, muito obrigado pela atenção e muito obrigado pela leitura”, disse.
Tardelli explicou que o artigo escrito por ele em 2006 era relativo a um processo de Júri, que não continha informações sigilosas.
“Se Vossa Excelência teve a honestidade de abrir o processo ‘com olhos de ver’, deve ter visto nesse processo aqui movimentação bancária, que foi exposta para todo mundo. A vida bancária das pessoas foi absolutamente vicerada. E, nesse aspecto, sim, o sigilo processual era necessário”, rebateu.
Segundo Tardelli, a publicidade dada ao processo da Operação Sodoma tem ferido os princípios legais.
“Ocorreu na audiência que a testemunha que foi ouvida chegou a dizer que sabia o que a testemunha anterior falou, pois viu no WhatsApp. O princípio da incomunicabilidade das testemunhas só se aplica quando a juíza quer. Todas as testemunhas que entraram na audiência sabiam o que as testemunhas anteriores haviam dito. Isto não é publicidade, é romper o princípio processual”, afirmou.
Postura polêmica
Pela defesa do sigilo, Roberto Tardelli conseguiu uma decisão que proibiu a imprensa de tirar fotos do ex-secretário Marcel de Cursi, durante o interrogatório do réu.
A postura foi criticada pelo coordenador do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), Marco Aurélio Castro.
Ele disse, em entrevista à imprensa, que o pedido do advogado “é de se questionar”, uma vez que Tardelli, quando era promotor de Justiça em São Paulo, tinha uma posição divergente sobre a cobertura jornalística em casos de repercussão pública.
“Eu conheço o dr. Tardelli pela imprensa. No caso da [Suzane] Richtofen, no qual ele era o promotor, fez inúmeras explicações à imprensa, sem limitar a atuação dos jornalistas, sempre colocando para a imprensa livre do Brasil a sua visão sobre o fato. Inclusive, o vi, em vários programas de TV. Cansei de ver o dr. Tardelli falando sobre o caso Richtofen, que foi um caso grave”, afirmou Castro, na última sexta-feira (22).
Porém, segundo o chefe do Gaeco, o advogado adotou postura contrária ao solicitar a proibição de imagens de Marcel de Cursi – acusado de ser o “mentor intelectual” do suposto esquema investigado na ação.
“E hoje, do outro lado da bancada, ou seja, não ocupando mais o cargo de promotor de Justiça, mas de advogado, ele [Roberto Tardelli] contraria o que sempre usou na tribuna do Ministério Público”, afirmou.
Entre no grupo do MidiaNews no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).
1 Comentário(s).
|
Arilson Barbosa 11.03.16 10h32 | ||||
Há na República Federativa do Brasil apenas três poderes: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. O Ministério Público não constitui ainda um poder como desejam ardorosamente seus membros. O Ministério Público é, e, ainda bem, um importante órgão do poder judiciário, assim como o é as polícias do poder executivo e os tribunais de contas do poder legislativo. | ||||
|