A comunidade jurídica nacional está perplexa com a liminar concedida pelo decano do STF para suspender parte da lei vigente há 70 anos que cuida do impedimento de Ministros da Suprema Corte. É claro que já houve diversas decisões questionáveis, jurídica e eticamente como, por exemplo, é o caso da liberação do julgador em atuar em casos de escritórios onde parentes sejam sócios.
Mesmo à vista de tantas decisões que fazem a jurisprudência da corte dançar um bolero confuso (competência jurisdicional, sobretudo), ainda podíamos reputar aos ministros o equilíbrio institucional diante dos idiotas que nos açulam a democracia. Além disso, o STF tem uma larga tradição de garantir direitos civis, destacando-se por ser um dos poucos tribunais progressistas do mundo.
De qualquer forma, a decisão monocrática de blindar a Corte de pedidos de suspensão é uma aberração. Por quê? Vamos à explicação. No nosso sistema republicano, os poderes cumprem funções diferentes. Frente a um imbróglio, contudo, incumbe ao Poder Judiciário dirimir querelas, sem exceção. Trata-se do princípio constitucional da inafastabilidade. Daí que o STF detém o poder constitucional de julgar as maiores autoridades da República.
É justamente por julgar tudo e todos que os ministros do STF podem ser representados por qualquer um do povo. Essa arquitetura jurídica é belíssima. Foi pela representação de cidadãos comuns que o Brasil assistiu a dois impeachments de presidentes. A vida política continuou com absoluta serenidade, sem turbulências institucionais, o que é fenomenal para um país com tradição de golpe de estado.
A partir da canetada de um único ministro, o direito de 200 milhões de brasileiros foi cerceado. Pior que isso: a finalidade dessa usurpação de acessibilidade popular é garantir que os próprios ministros estejam a salvo do processo de impedimento. O caso é escandaloso. Mas aposto que tudo se resolve, como sempre. Sobretudo porque deputados e senadores estão juridicamente comprometidos diante dos ministros que os julgam.
A única coisa que, como jurista, posso fazer é lamentar profundamente essa barafunda em que, em parte, nós próprios nos metemos. Devemos lembrar que tudo, tudo, tudo tem como origem o voto popular. É por isso que se revalida a máxima de Joseph de Maistre: o povo tem o governo que merece. Pessoalmente, eu diria que não é apenas o governo porque, sem qualquer dúvida, estão aí incluídos o Legislativo e o Judiciário. Infelizmente...
Eduardo Mahon é advogado, escritor e pesquisador.
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