LISLAINE DOS ANJOS
DA REDAÇÃO
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara de Cuiabá aprovou a constitucionalidade do projeto de lei que proíbe os motoristas de ônibus de exercerem a função de cobradores nos transportes coletivos.
Autor do projeto, o vereador Dilemário Alencar (PTB) afirmou que projetos de lei semelhantes já foram aprovados em outras cidades e espera que o mesmo aconteça em Cuiabá.
“O projeto já foi aprovado por unanimidade pela CCJ e, regimentalmente, quem tem o poder de colocá-lo na pauta de votação é o presidente da Câmara, o vereador João Emanuel (PSD). Mas, sinto que a maioria dos vereadores será favorável à sua aprovação”, afirmou.

"O projeto é claro: ficam obrigadas as empresas de transporte coletivo a terem em todos os ônibus em circulação as figuras distintas do cobrador e do motorista"
O parlamentar ressaltou que o projeto não somente proíbe a dupla função dos motoristas, como também cobra pelo retorno dos cobradores já retirados dos coletivos.
“O projeto é claro: ficam obrigadas as empresas de transporte coletivo a terem em todos os ônibus em circulação as figuras distintas do cobrador e do motorista”, disse.
Caso seja aprovado pela Casa de Leis, o projeto irá para a sanção do prefeito Mauro Mendes (PSB).
Na tentativa de sensibilizar o gestor municipal a não barrar o projeto, o vereador lançou, na semana passada, um abaixo-assinado com o objetivo coletar, pelo menos, cinco mil assinaturas de usuários de transporte coletivo na Capital.
“Todos os vereadores já assinaram o abaixo-assinado, que cobra a volta dos cobradores e a melhoria do transporte coletivo em Cuiabá. O abaixo-assinado está distribuído nos pontos de ônibus e entre os presidentes de bairros”, informou.
Modelo falho

"A qualidade dos serviços prestados à população piorou bastante, principalmente no caso de idosos e cadeirantes"
O vereador destacou que o sistema de “motorista/cobrador” se mostrou falho em outras cidades. Como exemplo, ele citou Curitiba (PR), conhecida como cidade-modelo em transporte coletivo, que fez uso do sistema por sete anos e o aboliu no ano passado.
Segundo o vereador, a adoção do sistema apontou um retrocesso na qualidade do serviço oferecido aos usuários, como tempos de viagens mais longos, e que o mesmo já pode ser sentido na Capital.
“A qualidade dos serviços prestados à população piorou bastante, principalmente no caso de idosos e cadeirantes, por exemplo, que precisam de auxílio para embarcar ou desembarcar do ônibus. Além disso, como a catraca fica próxima ao motorista e, às vezes, apresenta problemas para aceitar o cartão-transporte, formam-se longas filas nos pontos de ônibus, principalmente nos horários de pico, o que atrasa o cumprimento do itinerário”, explicou.
Dilemário ressaltou ainda o número cada vez maior de acidentes envolvendo passageiros que acabam caindo do transporte coletivo ou “imprensados” nas portas, por falta de visão do motorista.
“Com o ônibus lotado, o motorista não tem como ver se a pessoa já desceu ou não. Quem o auxilia é o cobrador. Da forma como está hoje, o motorista tem que fiscalizar a catraca, descer do ônibus para auxiliar a entrada de cadeirantes, ou seja, deixando sua função”, disse.
O vereador salientou ainda a obrigatoriedade do uso do cartão-transporte, em detrimento da moeda nacional corrente.
“É ilegal você forçar o usuário a adquirir o cartão-transporte. Você não pode se negar a receber a moeda nacional”, afirmou.

"Há ônibus com mais de 10 anos circulando pela cidade, muitos deles sem ar condicionado, sem acessibilidade e sempre quebrando nas vias públicas"
Sucateamento x falta de licitaçãoO vereador requer, ainda, a realização de uma nova licitação para concessão dos serviços de transporte coletivo na Capital – hoje controlados pelas empresas Integração Transportes, Expresso Norte Sul Transportes Urbanos e Pantanal Transportes.
“Entra governo e sai governo e não há licitação. O transporte em Cuiabá é uma verdadeira caixa preta. Há mais de 11 anos não é realizada uma nova licitação. Esse processo está fora da lei, sendo que é a melhor forma de dar melhores condições de serviço aos usuários. O Município precisa cobrar responsabilidade social desses empresários, que há anos se interessam apenas no lucro pelo lucro”, disse.
O vereador questionou o estado atual da frota de ônibus de Cuiabá, classificando-a como “velha e em péssimo estado”.
“Já pensaram em como vai ser quando o Veículo Leve sobre Trilhos ficar pronto? A pessoa sai do VLT, que tem ar-condicionado, novo, confortável, e entra em um desses ônibus sucateados”, criticou.
“Há ônibus com mais de 10 anos circulando pela cidade, muitos deles sem ar condicionado, sem acessibilidade e sempre quebrando nas vias públicas. Temos um dos piores transportes coletivos do país e a segunda maior tarifa de ônibus dentre as capitais. Isso é totalmente incoerente”, completou o vereador.
PolêmicaDesde o segundo semestre de 2011, os cobradores passaram a ser retirados das linhas de ônibus da Capital – incialmente nos bairros e posteriormente na região central –, o que causou transtornos aos usuários.

"Entra governo e sai governo e não há licitação. O transporte em Cuiabá é uma verdadeira caixa preta"
Até então, a justificativa das empresas para a medida era de que, com a retirada dos cobradores, há diminuição dos custos das empresas e, consequentemente, reflete na redução da tarifa cobrada dos passageiros – atualmente fixada em R$ 2,95.
Automaticamente, os motoristas também ganharam mais atribuições, uma vez que passaram a receber o dinheiro da passagem, passar o troco e liberar a catraca.
A polêmica aumentou com a aprovação da lei 5.541, de 27 de abril de 2012, que determina a obrigação do uso do cartão eletrônico para o pagamento da tarifa de ônibus convencionais e alimentados do transporte coletivo urbano.
O Ministério Público Estadual (MPE) ingressou com uma ação civil pública contra as empresas de ônibus, para impedir que os motoristas exerçam dupla função, além de solicitar da Associação Matogrossense de Transportes Urbanos (MTU) a construção de mais pontos de aquisição do cartão transporte.
A Justiça concedeu liminar, que foi contestada pelas concessionárias do serviço. Em abril deste ano, o pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve a decisão contrária às empresas.
Outro ladoA MTU informou, por meio de assessoria, que a decisão já vem sendo respeitada pelas concessionárias do serviço, que também não buscaram recorrer da decisão.
A associação salientou que decisão judicial não trata da obrigatoriedade do retorno dos cobradores aos ônibus da Capital e que isso ficou a cargo de cada empresa. Atualmente, apenas a Expresso norte Sul mantém alguns cobradores em suas linhas de ônibus.
De acordo com a MTU, cobradores que antes ficavam dentro dos coletivos se tornaram monitores de vendas de cartão simples de passagem. Atualmente, há 180 monitores distribuídos pelos pontos da Capital, além de nove pontos do MTU Fácil – “quiosques” da associação para compra e recarga do cartão-transporte.
DadosAtualmente, estima-se que Cuiabá possua 330 mil usuários de transporte coletivo, dos quais 90 mil seriam isentos do pagamento da tarifa, 30 mil são idosos, policiais militares e hemofílicos e outros 60 mil são estudantes (neste último caso, o custo é dividido entre a Prefeitura de Cuiabá e os usuários pagantes).
A frota atual, segundo a MTU, é de 380 veículos ativos para atender a Capital.